Preciso dizer que no próximo filme do M. Night Shyamalan não vou querer saber absolutamente nada sobre o filme. Pelo menos, não antes de estar sentado diante da tela. Não quero saber se é o vento, se são as plantas, se o Bruce Willis está morto, se são ETs ou se é uma ninfa notória na piscina do residencial dali da esquina. Não me contem, por favor: já me dei conta dos seus temas recorrentes, da razão contestada pela crença e da realidade pela imaginação e, por ora, isso basta. A partir de hoje, vou me esconder de todas as notícias relacionadas, das possíveis sinopses que aparecem na internet antes mesmo de existirem sinopses, dos trailers, das filmagens feitas por seguranças de set e principalmente dos amigos que cinicamente revelam o final do filme na maior cara-de-pau (tipo 'pois é, o Bruce Willis está morto, você não sabia?'). Só a termo de curiosidade, resolvi me ater apenas ao nome temporário: '
The Last Airbender'. Pronto, estou satisfeito. Por sinal, se deixar de ler o
Omelete e me garantir só pelo título original, talvez consiga fugir do inevitável mar de informações (e da minha curiosidade louca) e tenha mais chance de chegar como uma tábula rasa ao lançamento. Pergunto-me se a filmografia do cineasta não nos diz de alguma forma que que todo o 'adorno' exterior e anterior à obra é desnecessário e que se usado em doses drásticas pelo espectador, só tende a interferir também drasticamente na experiência estética primeira. Aqui, as preliminares não são lá um sucesso. Admito que exista até um culto aos subprodutos ou derivados culturais e esse culto baseado no excesso de informações e fontes traz um tédio: o fato de chegarmos sobrecarregados de vestimentas e preconceitos na sala de exibição. Dependendo da tradução de seu proximo filme, poderia até ficar confuso e terminar só o assistindo em casa. Provavelmente não. Convenhamos que o nome Shyamalan tem cacife suficiente para surgir antes do título seja qual for. E posso usar essa idéia não de maneira tão trivial ou literal, mas como uma parábola da existência de uma proposta estética, pessoal e arriscada do diretor, característica da qual todos nós sabemos que o cinema americano muito carece (e, não sejamos ingratos, que também muito se orgulha). Sempre vou defendê-lo nesse aspecto e nem sempre apreciá-lo por causa disso.
Acontece que mesmo antes de terminar
Fim dos Dias (
The Happening), já estava pensando que o Shyamalan funciona melhor quando não sabemos muito sobre ele. Talvez pudesse usar '
O Sexto Sentido' como um bom exemplo disso, mas como o assisti aos 15 anos no cinema (e realmente não sabia nada sobre), prefiro me dar o direito da dúvida diante dessa experiência passada. Melhor seria usar
A Dama na Água para ilustrar. Mesmo tendo lido algo aqui e ali, assisti com poucas pré-informações e com as piores pretensões possíveis e saí com uma puta sensação boa. Não é que de um aparentemente momento ingênuo, de uma premissa quase ridícula, Shyamalan conseguiu ultrapassar o campo de simples fábula delicada e nos conduziu através de um jogo de arquétipos do qual podemos extrair algumas de suas conotações de cinema. Enxergo ali uma defesa do contrato de crença entre a ficção lançada pelo diretor e a necessidade de embarque do espectador. É uma pena que todas as outras obras de sua filmografia não tenham conseguido me colocar completamente dentro do trem. Sempre fica engasgado um gostei-e-não-gostei-tanto-assim. Isso me perturba pelo simples fato de ser mais fácil discorrer sobre certezas que sobre incertezas. E com Shyamalan muito me parece incerto. Antes dos respectivos lançamentos de seus filmes, lia muito, muito mesmo, começava a acompanhar desde a idéia as recentes críticas, de modo que mesmo com as surpresas, as reflexões e alguns sustos, terminava sentando diante de um espetáculo 'esperado' demais. E convenhamos, essa é uma situação muito da chata. No caso de '
A Vila', o acontecimento (rá) foi ainda mais radical. Eu até comentei ontem com
Hermano - leiam o texto dele - que tinha ido ver sem saber muita coisa. Pura mentira. Lembrei que Cecília me contou tudo. Todo final e tal e tal que não vou contar aqui porque está muito recente e você ali e ali podem ainda não ter visto. Ah, não pensem nada de errado da pobre Cecília. Ela é uma pessoa ótima. Eu totalmente desestimulado com o Shyamalan por conta de '
Corpo Fechado' e '
Sinais' quis sacrificar seu costumeiro maior trunfo: o fim. Daí pedi pra ela contar em detalhes e só dei a justificativa que 'não iria ver mesmo'. Semanas depois assisti e me senti culpado como poucas vezes. Acho engraçado eu ter esquecido isso.
Ontem, quando fui ao Shopping Boa Vista (ou como quiserem chamá-lo) já sabia, por sinopses e afins, que em
Fim dos Tempos 'por algum motivo' as pessoas começam a se matar e sabia, pelo cartaz, que ia rolar uma fuga tendo como ponto condutor um homem, uma mulher e uma criança. Daí não precisei muito para deduzir parte do roteiro quando na primeira cena do Mark Wahlberg professor, um aluno questionado sobre o motivo do desaparecimento das abelhas, comenta que existem razões na natureza que nunca poderemos entender completamente. A narrativa me soou muito didática desde esse ponto. Logo depois chegam as notícias e já sabemos que o comentário anterior funcionou como um resumo do que se abateria sobre eles, trazendo aos espectadores, e ressaltando sempre ('são os terroristas', 'são as plantas', 'só ataca em grandes grupos'), a variabilidade do entendimento que podemos ou não ter do fenômeno. Aquela cena me soou como uma justificativa da não-razão dos fatos. Por muito pouco o filme não me perdeu nesse momento, mas aí pensei em Hitchcock e entrei na curiosidade do percurs. Mesmo pouco disposto aceitei o contrato e embarquei no trem. Imaginei que era como o garoto carregando a bomba em
Sabotagem (1936). Sabemos que aquela caixa vai acompanhá-lo, que pode matá-lo pois contém uma bomba e não sabemos o porquê da bomba e na iminência da explosão, isso pouco importa. Acho que pensar em Hitchcock foi uma boa saída como espectador. Deu-me fôlego ao que viria a seguir e me abriu a possibilidade de me apegar mais ao imagético que ao narrativo. Foi o que fiz. E nesse ponto, o filme passou a me impressionar muito, principalmente pelas cenas que se desvinculavam do homem, da mulher e da criança. Cenas isoladas como a passagem do ET na televisão, supostamente no Brasil, em
Sinais. Em
Fim dos Dias tive a mesma sensação várias vezes. Algo que realmente me abateu . Desde os pedreiros se jogando do alto das construções logo no início, passando pelo lindo plano-sequência a partir da morte de um policial (com a câmera rente ao solo acompanhando a arma) até o rapaz se deixando comer pelos leões vistos por um celular. É meio as mil e uma maneiras de filmar um suicídio. Fiquei feliz dele não ter se repetido.
Esquecendo a narrativa e se apegando as imagens, não precisei muito pra estar totalmente envolvido pelo espetáculo belamente assustador da auto-destruição substituindo a auto-preservação. Tudo isso em larga escala me causou um temor agradável. Isso fez com que o tom de previsibilidade e dedução fosse esquecido, dando lugar a força das imagens. Pode ser B e divertido, como diz o diretor, mas me tocou de outra maneira. Talvez eu seja um suicida em potencial e não saiba. Vale dizer que entre deduções e previsões, a maior surpresa foi a velhinha que aparece já perto do fim. Pois é, eu e metade do cinema levamos àquele maldito susto. Adoro a balbúrdia pós susto numa sala de cinema. Alguns xingam, outros riem, outros continuam no susto. Mas voltando a velhina, em primeiro lugar não esperava que ela fosse surgir (diferentemente da casa trancada onde os fugitivos são recebidos a bala o que é bem previsível), segundo que sua morte é claramente a mais horror B de todas. Um verdadeiro misto de susto e riso. Dá vontade até de xingar. Pois é, fiquem de olho na velhinha.
PS.: Não posso deixar de comentar que um dos trailers passados foi o de
Arquivo X: Eu Quero Acreditar. Como bom fã da série só tenho a dizer que não acredito.