segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

Projetos literários premiados



Dois jovens pernambucanos ganham bolsas nacionais: uma para escrever um livro, outra para pesquisa acadêmica

Schneider Carpeggiani
carpeggiani@gmail.com

Talles Colatino
tcolatino@jc.com.br

Pernambuco foi destaque em dois concursos que procuram reter a literatura contemporânea por dois ângulos distintos, mas que se complementam: o de quem produz ficção, o de quem analisa essa produção. O estudante de jornalismo Rodrigo Almeida, de 22 anos, foi um dos vencedores da 3ª edição do Rumos Literatura do Itaú Cultural, com o projeto Processos Multimidiáticos de Colaboração e Interatividade na Crítica Literária Brasileira Contemporânea: Um Estudo de Caso do Site Overmundo. O Overmundo é um endereço online participativo – onde os internautas constroem o seu conteúdo, ressaltando a máxima de quem nenhum texto é isolado em si mesmo.

A também estudante de jornalismo Julya Vasconcelos, 23 anos, foi vencedora de uma das bolsas da Funarte de estímulo à criação literária, para desenvolver um livro, no valor de R$ 30 mil. A cada ano, a Funarte distribui 10 bolsas para candidatos de todo o Brasil. Na lista de vencedores, faz parte nomes consagrados como o poeta gaúcho Fabrício Carpinejar. Seu projeto é Agudo como mordida, que tem de ficar pronto até julho deste ano.

Enquanto os concursos literários premiam a obra final, a Funarte estimula o necessário “rascunho”. “É uma bolsa de estímulo, não uma premiação para uma obra já realizada. Então, dez projetos de livros com trechos já produzidos – e não livros finalizados – foram selecionados para que os autores pudessem escrever a obra. Acho uma iniciativa fantástica, porque é difícil ter a possibilidade de ser patrocinado para escrever. No geral, os autores passam por maus bocados para conseguir finalizar um livro”, afirma Julya.

Essa é daquelas autoras para quem rótulo é perda de tempo. Seu texto trafega por inúmeros gêneros, com vários disfarces. “O livro (Agudo como mordida) é uma coletânea de poemas, mini-contos e pequenos textos organizados em três capítulos, mais estéticos que temáticos. O primeiro aglutina poemas e pequenas narrativas amarradas por um clima de auto-revelação, todos em primeira pessoa. O segundo é um amálgama de pequeníssimos textos, exercícios de micropercepção que chamo Na dose certa para não matar os cavalos. O terceiro é dedicado a três personagens: Tereza, Silvia e Rita”, explica.

Julya faz parte de uma geração que encontrou o futuro do romance mais uma vez sendo questionado. Não que poucas narrativas longas sejam lançadas, mas qual o valor delas num mundo onde a fragmentação é cada vez fala mais alto? “Eu concordo que os textos fragmentados são tendência natural do nosso tempo. Só não concordo com uma certa visão fatalista e lamentosa disso. E acho que a tendência do romance é de decadência, sim. Há muito tempo se fala sobre isso. Mas também acredito numa posterior renovação, por que não? As coisas estão em eterna mutação e acredito que podem conviver e renascer”.

RUMOS

O programa Itaú Cultural: Rumos Literatura divulgou, no final do ano passado, os selecionados na categoria Literatura. O projeto, na categoria crítica literária (ambição de muitos estudiosos, por garantir um apoio financeiro e acadêmico para projetos de pesquisa), contemplou apenas um pernambucano. E engana-se quem pensa se tratar de um doutor em letras ou ao menos um graduando na área. Rodrigo Almeida tem apenas 22 anos, está terminando o curso de jornalismo e foi classificado com um trabalho bem inusitado sobre os processos interativos numa crítica literária atípica: a publicada no site colaborativo Overmundo.

O Overmundo permite que qualquer internauta ajude na construção do seu conteúdo, aprimorando o processo de circulação da informação. “Basicamente, meu ensaio pretende investigar as metamorfoses acontecidas – e que ainda estão em andamento – nas críticas literárias publicadas na internet, as diferenciando inclusive das publicadas em mídia impressa, tomando como objeto central de estudo o Overmundo”, explica Rodrigo, assumidademente fã de tecnologia, literatura e cinema. “No caso do Overmundo, além da palavra escrita propriamente dita, o colaborador pode complementar a crítica literária com fotos, vídeos, flash-art, arquivos de áudio, toda uma gama de recursos que são bem limitadas na mídia impressa. Não existe um formato pré-estabelecido para a crítica literária: ela se mistura, flerta com outros gêneros, torna-se outra”, complementa. O desafio de Rodrigo nesse trabalho é justamente fazer um paralelo entre o tratamento que a crítica literária recebe nas mídias ditas tradicionais e nos novos campos midiáticos. “Pretendo me focar na abertura que o mundo online dá a criação e divulgação do trabalho crítico”.

Em novembro passado, o programa realizou um colóquio entre todos os selecionados, para uma apresentação do mapeamento dos trabalhos inscritos. No encontro, a experiência de trocar idéias sobre o seu trabalho e o dos outros garantiu ao jovem pesquisador uma certeza maior da consistência do seu projeto. “Dentro do colóquio, achei que o meu projeto foi um dos mais contemplados tematicamente. Rolou uma oficina de literatura não-linear e todas as discussões sobre crítica literária contemporânea terminavam enveredando para o lado da tecnologia”. Para tal realização, o Itaú Cultural garante uma bolsa mensal de R$ 850 e R$ 400 em livros para o desenvolvimento do projeto, além do prêmio de R$ 1.800 pela publicação do texto.

Rodrigo termina a graduação esse mês, apresentando seu site de crítica crítica de cinema, o Dissenso (www.dissenso.wordpress.com), como o projeto de conclusão de curso. E uma nova etapa termina para que outra comece logo mais: ele acabou de ser selecionado no mestrado em comunicação da UFPE. ”Estou me formando agora em janeiro e em março já começo o mestrado. Tenho, sim, pretensão em seguir carreira acadêmica, mas o que quero mesmo é assumir um caminho interdisciplinar que envolva cinema, comunicação e literatura”, confessa.

Um comentário:

Rodrigo Almeida disse...

só um adendo: a verba de R$ 400 reais foi uma parcela única. A bolsa sim, mensal com duração de 10 meses, era no valor de R$ 850 (e com descontos fiscais ficava na casa dos R$ 750)