Sempre que entramos na casa dos outros, seja um antiquário ou aquele apartamento recém montado, no episódio em que damos de presente panos de prato ou um conjunto de copos e ganhamos cervejas e feijoada, não deixamos de reparar na disposição dos objetos, o forro do sofá, o tamanho da cozinha, a ventilação, a televisão resgatada do abandono na casa de alguma tia, sem perder de vista o desenrolar dos donos nos ambientes que, com tanto carinho, montaram. Notem as expressões desesperadas quando a primeira bebida cai sobre o tapete. Tenho uma sensação semelhante com alguns filmes e com O Estranho Caso de Angélica - prometo não me prolongar - vemos se alastrar nos aposentos da casa da falecida do título e na pensão, uma cuidadosa ordem da posição dos quadros, do estilo da luminária, da mesa e das cadeiras, o tipo de torneira, o pé da escrivaninha e, sobretudo, o ponto da câmera para que tudo esteja numa ruidosa harmonia. E, tratando-se de Manoel de Oliveira, nada me parece mais simbólico que o cuidado demonstrado na última cena: a dona da pensão vagarosamente fecha a janela antes dos créditos. Não me surpreende que as crianças e jovens sempre esqueçam aberta.
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