Bastardos Inglórios não é um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, mas um inventário do repertório cinematográfico de Tarantino; uma mistura do seu apelo cinéfilo pessoal com o imaginário audiovisual do conflito, forjado película a película, durante os últimos cinquenta anos. Mais uma vez o cineasta aponta para o próprio cinema, faz um filme de mediação desta vez tomando um evento histórico como pano de fundo para inundar a tela com suas referências. Traça, portanto, uma releitura do blaxploitation italiano Quel Maledetto treno blindato (1978), de Enzo Castellari, homenageia com a sua cena inicial Era uma vez no Oeste (1968), de Sérgio Leone, e numa sequência parodia O Poderoso Chefão (1972) com um Brad Pitt emulando descaradamente o Don Corleone de Marlon Brando. Tarantino é um detalhista convicto: recria cartazes de filmes da época, copia cabelos, refaz o vestido vermelho de Verônica Voss, revela suas paixões por meio da trilha sonora, pega de empréstimo expressões sutilmente sarcásticas. A narrativa acompanha dois planos para assassinar Hitler, o primeiro organizado por uma mulher judia dona de um cinema em Paris, outro planejado por um grupo de soldados judeus americanos, conhecidos como Bastardos Inglórios, movidos pela vingança. Famosos por quase não fazerem reféns, por terem ordens de matar cem nazistas para cada um, o grupo gera um temor nos oponentes por deixarem os raros sobreviventes marcados com uma suástica na testa. Decerto, a força da produção está em parte na capacidade de Tarantino em construir uma encenação segura, elevando ao máximo a ênfase dramática do elenco e dos elementos em quadro. Aliás, o diretor norte-americano costura clichês e subversões de inúmeros gêneros, literalmente como um montador costura um filme de guerra por meio de recortes deslocados, vindos de épicos, de faroestes, da comédia, do melodrama e até mesmo do terror. Tarantino propõe uma transgressão absoluta diante do compromisso com o campo histórico, o filme reforça uma imagem autônoma numa espécie de realidade paralela, um universo que trata de uma época sugerindo outras ações e consequências. Bastardos Inglórios não é um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, mas uma colcha de retalhos audiovisuais do tempo que nos separa do próprio evento.
terça-feira, 12 de janeiro de 2010
Inglórios
Bastardos Inglórios não é um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, mas um inventário do repertório cinematográfico de Tarantino; uma mistura do seu apelo cinéfilo pessoal com o imaginário audiovisual do conflito, forjado película a película, durante os últimos cinquenta anos. Mais uma vez o cineasta aponta para o próprio cinema, faz um filme de mediação desta vez tomando um evento histórico como pano de fundo para inundar a tela com suas referências. Traça, portanto, uma releitura do blaxploitation italiano Quel Maledetto treno blindato (1978), de Enzo Castellari, homenageia com a sua cena inicial Era uma vez no Oeste (1968), de Sérgio Leone, e numa sequência parodia O Poderoso Chefão (1972) com um Brad Pitt emulando descaradamente o Don Corleone de Marlon Brando. Tarantino é um detalhista convicto: recria cartazes de filmes da época, copia cabelos, refaz o vestido vermelho de Verônica Voss, revela suas paixões por meio da trilha sonora, pega de empréstimo expressões sutilmente sarcásticas. A narrativa acompanha dois planos para assassinar Hitler, o primeiro organizado por uma mulher judia dona de um cinema em Paris, outro planejado por um grupo de soldados judeus americanos, conhecidos como Bastardos Inglórios, movidos pela vingança. Famosos por quase não fazerem reféns, por terem ordens de matar cem nazistas para cada um, o grupo gera um temor nos oponentes por deixarem os raros sobreviventes marcados com uma suástica na testa. Decerto, a força da produção está em parte na capacidade de Tarantino em construir uma encenação segura, elevando ao máximo a ênfase dramática do elenco e dos elementos em quadro. Aliás, o diretor norte-americano costura clichês e subversões de inúmeros gêneros, literalmente como um montador costura um filme de guerra por meio de recortes deslocados, vindos de épicos, de faroestes, da comédia, do melodrama e até mesmo do terror. Tarantino propõe uma transgressão absoluta diante do compromisso com o campo histórico, o filme reforça uma imagem autônoma numa espécie de realidade paralela, um universo que trata de uma época sugerindo outras ações e consequências. Bastardos Inglórios não é um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, mas uma colcha de retalhos audiovisuais do tempo que nos separa do próprio evento.
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