tag:blogger.com,1999:blog-22281404595127725712024-03-14T04:20:27.519-03:00velhos hábitosRodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.comBlogger740125tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-10171252576189160842013-10-22T19:01:00.004-03:002013-10-22T19:06:02.961-03:00A vida real nas ruas<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-5UQRVB-KRSQ/Umb0Z7Ni_qI/AAAAAAAACLg/7pT8EcM68f0/s1600/vlcsnap-2013-10-22-19h54m12s4.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="214" src="http://4.bp.blogspot.com/-5UQRVB-KRSQ/Umb0Z7Ni_qI/AAAAAAAACLg/7pT8EcM68f0/s640/vlcsnap-2013-10-22-19h54m12s4.png" width="511" /></a></div>
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Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-9228179278668243182013-10-22T17:42:00.000-03:002013-10-22T18:22:10.938-03:00O Cinema e a Estetização da História: Um Debate Epistemológico(Artigo publicado originalmente no e-book <i><a href="http://www.ufpe.br/editora/ufpebooks/outros/cine_memoria/" target="_blank">Cinema e Memória</a>)</i>
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O passado será considerado como sempre reconstituído e organizado sobre a base de uma coerência imaginária. </blockquote>
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Beatriz Sarlo</blockquote>
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O emaranhado de conexões que se configura entre os sujeitos e o cinema, passando pelas esferas da estética, do afeto, da cultura, da economia, da sociabilidade e da história, não fortaleceu suas raízes sem razão, afinal, nunca se produziu, reproduziu, distribuiu e consumiu tantas imagens como nos últimos cem anos. A própria ontologia do olhar diante da efígie do universo em que o olho se encontra foi constantemente redimensionada, criando um sistema de visibilidade singular, cuja marca está presente no detalhado registro / fabulação audiovisual dos fatos e da história por parte dos meios de comunicação de massa. Para Walter Benjamin, o curso de transformações tecnológicas ocorridas ao longo de grandes períodos, “juntamente com o modo de existência das comunidades humanas, modifica também seu modo de sentir e de perceber. A forma orgânica que a sensibilidade humana assume – o meio no qual ela se realiza – não depende apenas da natureza, mas também da história” (1990, p. 214). Os mesmos acontecimentos e processos foram retratados de diferentes modos, seguindo intenções e metodologias até contrárias, inseridos em distintas estratégias narrativas e contextos; mitos, monumentos e lendas foram erguidos, invertidos e destruídos; os discursos alternaram dos fielmente adaptados até os livremente distorcidos.<br />
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Praticamente toda história da humanidade foi projetada na tela: os campos de concentração se encravaram na memória, as guerras das últimas três décadas foram acompanhadas dia a dia, seja com balas zunindo ao lado das lentes, seja na abstração de pontos luminosos riscando o céu. Cidades polonesas, russas e aldeias no Pacífico completamente destruídas. Um museu de Hiroshima com cabeleiras de suas vítimas. A garota nua correndo com o corpo recém-queimado de <i>napalm</i>. As câmeras, gravadores e seus guias confinaram os acontecimentos no regime da estética, retrataram costumes, captaram o desabrochar microscópico da natureza, o desespero das tragédias, geraram fotogramas para uma crise, cristalizando no limítrofe da incerteza, espíritos / subversões de diversas épocas, instantes e lugares, multiplicando a gama, modificando perspectivas, afirmando a técnica e diminuindo a credibilidade dos manuscritos históricos. O cinema foi capaz de carregar pontualidade, ilusão e transcendência; capaz de aguçar e cegar por meio de uma única imagem, misturando épocas e observações, recorrendo ou caindo no anacronismo, fundindo história de outros séculos com memória afetiva, assumindo um caráter arqueológico e fazendo as idiossincráticas relações imagéticas entre presente e passado atuarem sobre os indivíduos contemporâneos essencialmente em dois níveis. Ao mesmo tempo em que intensificam o sentimento de nostalgia, melancolia e pertencimento, para além das antigas formas de representação e reforçando alegorias do presente; também carregam o papel de mediadoras e ordenadoras do imaginário cultural que gerencia boa parte das referências dos séculos restantes. O cinema desenvolveu ao longo das décadas a especialidade de encurtar distâncias.</div>
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Nesse sentido, vivemos uma gradual substituição dos fatos pelas imagens dos fatos, o cinema passou a referendar não apenas distintos estatutos de sensibilidade ou “uma crise da interpretação, mas uma mudança vertiginosa das instituições que podem emitir interpretações autorizadas” (SARLO, 2005, p. 59), de modo que os eventos são lembrados pelos filmes, personagens históricos se confundem com os atores que os interpretaram, os mapas se passam pelo território real (SALIBA In NAPOLITANO et al, 2007). Naturalmente, se tomarmos a história como um campo de conquista da representação e da narração ao longo dos séculos, sempre numa perspectiva de um presente deslocado que olha um passado em movimento, é importante focarmos <i>em quem contou, quando se contou, sobre quem se contou e a forma como se contou</i>, reforçando a maneira pelo qual o cinema contemporâneo traduz de maneira concomitante, diferentes epistemologias provenientes da Teoria da História, desde os primeiros arcabouços, passando pelos cientificistas até as proposições pós-modernas. O próprio Heródoto, ainda na Antiguidade Clássica, costumava relatar todas as versões reconhecidas de uma mesma história, criando um painel multifacetado capaz de estimular a própria interpretação dos ouvintes / leitores. A partir de metáforas e outros tropos, o cinema adensou esse processo e foi capaz de estabelecer uma espécie de comentário sobre a história da historiografia, uma ponderação sobre a relação entre presente, passado, verdade, realidade, vestígios, subjetividade, mídia e mensagem, numa espécie de confrontação metahistórica fortemente influenciada pelo regime da estética.
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Os variados pontos de partida de uma cinematografia que emula e funde campos opostos da historiografia produziram distintos arranjos de passado, esboçando um território imagético tecido por graus de deformação no procedimento de mimese (WHITE, 1995), seja pelos floreios estéticos, pela facha ideológica, seja pela substituição de lacunas por especulações ou pela recepção dos espectadores. O cinema, radicalizando os passos da literatura, da escultura e da pintura, enfim, na afirmação da memória como espaço de problematização política, jogando com o que lembramos e com o que podemos / deixamos esquecer (WHITE, 1995), se posicionou na interseção entre crença e conhecimento: à medida que aumenta seu peso “na construção do público, aumenta também sua influência sobre as construções do passado” (SARLO, 2007, p. 92). A sétima arte se tornou um dos meios essenciais para se discutir as relações e influências mútuas entre história e estética, interferindo definitivamente no imaginário de um público massificado com referências cada vez mais obtusas, presos a uma velocidade que dificulta a assimilação de conteúdos, estruturas, trocas e mudanças. Aliás, há um apontamento “difuso e arraigado em nossa psique – os filmes históricos, mesmos quando sabemos que são representações fantasiosas ou ideológicas, afetam a maneira como <i>vemos o passado</i>” (ROSENSTONE, 2010, p. 18). Desenha-se, assim, uma paisagem política que pende entre a alienação, a compreensão e a transmutação de sentidos, espaço em que as “operações com a história entraram no mercado simbólico do capitalismo tardio” (SARLO, 2007, p. 11).
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Portanto, a imbricada penetração da estetização da história no consumo cinematográfico contemporâneo – minimizando o debate sobre quais representações seriam “mais corretas” e enfatizando a variedade de construções narrativas –, gera um ponto de investigação que respeita a liberdade artística e inventiva dos cineastas para então traçar um mapeamento de diretrizes do passado imaginário a partir de uma gama de ficções audiovisuais. Essa problemática mantém uma conexão entre o campo da estética e o desenvolvimento metodológico proposto no campo historiográfico pela Escola dos Annales e pela Nova História. Diversos autores passaram a descartar a existência de um ângulo correto ou perspectiva verdadeira nas leituras históricas, estimulando leituras criativas do passado (WHITE, 1995), que dependiam de um escopo de percepções e intenções, da decisão pelos modos narrativos de encadear e adaptar as fagulhas e vestígios dentro da estrutura da linguagem. O próprio historiador Marc Bloch defende que os profissionais que trabalham com a <i>arte do tempo</i> “precisam evitar tirar de nossa ciência sua parte de poesia” (2011, p. 19). Tanto a arte como a história – sempre imbricando uma na outra – se livraram do fardo de traçarem em suas poéticas uma pretensa cópia literal da realidade, de forma que estamos mais acostumados a ler livros ou assistir filmes que retratam uma mesma época ou personagem com princípios e ambições antagônicos, produzindo uma série de camadas sobrepostas e contraditórias. O passado se fortalece não como uma massa imutável, mas como um caderno de rascunho passível de intervenções transversais.
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<b>Epistemologias esquadrinhadas</b></div>
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Desse modo, dentro de uma espécie de 'leitura cinematográfica da história e uma leitura histórica do cinema' (FERRO, 1992), nasce a consciência de que os filmes podem ser considerados como testemunhos que perduram: não apenas carregam 'O' tempo histórico, seja da época em que foram produzidos, do acontecimento sobre o qual se debruçam ou mesmo do transcorrer e reviravoltas de sentido, como possuem 'os' tempos afetivos ligados aos espectadores em diferentes contextos, encobrindo as obras de uma ambiguidade permanente. Esse jogo cruzado de temporalidades é traduzido audiovisualmente por meio da condução da estrutura narrativa e pode ser observado a partir de três grandes tomos epistemológicos dos processos de estetização da história – não absolutos e não totalizantes, passíveis de entrecruzamentos e combinações num único filme. São eles: 1. Monumentalização e Desmistificação; 2. As Alegorias do Presente e 3. Ucronias e Anacronismos. O reordenamento conceitual, estético e ideológico do passado, suas variantes e implicações no imaginário contemporâneo, seguem a dificultosa condição da <i>arte do contar</i>, princípio básico da criação artística na literatura, se envolvendo na astúcia, observada por Guimarães Rosa, que certas coisas passadas têm de se remexerem dos lugares: “são tantas horas de pessoas, tantas coisas em tantos tempos, tudo miúdo recruzado” (2006, p. 184).
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Quando Walter Benjamin escreve sobre a diferença entre o que de fato aconteceu e a maneira como contamos, conceito chamado de <i>rememoração</i>, registra a subjetividade que une o passado ao contemporâneo através de nossa existência como sujeitos:
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nunca podemos recuperar totalmente o que foi esquecido. E talvez seja bom assim. O choque do resgate do passado seria tão destrutivo que, no exato momento, forçosamente deixaríamos de compreender nossa saudade. Mas é por isso que a compreendemos, e tanto melhor, quanto mais profundo jaz em nós o esquecido (1984, p. 104/105).</div>
</blockquote>
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O autor defende incisivamente essa natureza própria da faculdade mental que é a memória, capaz de largar ou remontar pedaços de passado pelo caminho, deturpando presenças e colhendo mentiras. Decerto, a narração depende da distância que estabelecemos com a experiência, de modo que o passado assume formas diferentes, seja pela inexistência de vestígios suficientes que estimula uma literatura das lacunas, seja pelo transcorrer dos anos que ampliam o abismo criativo entre o acontecimento e o presente, obrigando um malabarismo de acentos e vírgulas; seja pela distorção premeditada, que adapta curvas narrativas aos ouvidos de um e de outro, personalizando sentidos para cada caso, no intuito de tirar vantagens ou enfatizar derrotas. Benjamin começa seu famoso artigo sobre o narrador, dizendo que "por mais familiar que seja seu nome, o narrador não está de fato presente entre nós, em sua atualidade viva. Ele é algo de distante e que se distancia ainda mais" (1994, p. 234). Por isso não podemos confiar em filmes como <i>India Song</i> (França, 1975), de Marguerite Duras, não por algum tipo específico de deslealdade, mas pela ânsia em romper com os pactos narrativos tradicionais que nos confortam, uma necessidade em afirmar que não se pode narrar como antes, cavando e cruzando discursos que desalinham a relação entre imagem e palavra. O filme é inteiramente narrado por vozes em off, vozes em fluxos de consciência que atravessam distintos patamares da linguagem e do tempo, manchando os enquadramentos com seus espectros semicerrados. Portanto, a mesma voz que remonta experiências passadas diante de uma dança no salão, pode ser da embaixatriz há alguns anos na França ou na Índia; talvez seja resultado de uma observação, num deslocamento sutil para outro cômodo da mansão, de um homem fora de quadro, mas certamente de olhar arguto e desejos lascivos; ou quem sabe, ser um diálogo ácido entre subalternos escondidos, deste ou de outro tempo, que não deixam passar detalhes sórdidos da protagonista deslumbrada. A produção acompanha o ritmo das Monções, sempre enganando a direção dos navegantes por meio de mudanças violentas e repentinas.</div>
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É inegável que os processos de produção de consciência - 'fabricantes da história' e criadores de um mundo extinto (ROSENSTONE, 2010) – antes nas mãos de filósofos e pensadores, hoje têm sido perpetuados e maculados através dos discursos cinematográficos. Universos foram recriados por cineastas que apostaram na interpretação do passado a partir de suas impressões e dinâmicas afetivas, estéticas e políticas bastante particulares. O uso da ficção para estabelecer essa relação entre estética e história se dá porque, assim como acredita Paul Feyerabend, “necessitamos de um mundo imaginário para descobrir os traços do mundo real que supomos habitar (e que, talvez, em realidade não passe de outro mundo imaginário)” (1977, P. 42/43). Logo, o passado recriado no cinema carrega uma parábola da realidade para além do ambiente cinematográfico ou como nos diz Jacques Rancière:</div>
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O real precisa ser ficcionalizado para ser pensado […] A noção de 'narrativa' nos aprisiona nas oposições de real e do artifício em que se perdem igualmente positivistas e desconstrucionistas. Não se trata de dizer que tudo é ficção. Trata-se de constatar que a ficção da era estética definiu modelos de conexão entre apresentação dos fatos e formas de inteligibilidade que tornam indefinida a fronteira entre razão dos fatos e razão da ficção, e que esses modos de conexão foram retomados pelos historiadores e analistas da realidade social. Escrever a história e escrever histórias pertencem a um mesmo regime de verdade (RANCIÈRE, 2005, p. 58).
</blockquote>
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<b><br />Monumentalização e Desmistificação</b><br />
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<b><br /></b></div>
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O processo de monumentalização do passado é marcado por uma visão direcionada pela sobrevivência de grandezas, pela existência do olímpico, natureza indistinguível da ficção mítica (NIETZSCHE, 2003). É um exemplo da história dos acontecimentos, por meio de filmes, geralmente <i>blockbusters </i>como <i>300</i> (EUA, 2006), de Zack Snyder ou <i>10000 a.C,</i> de Roland Emmerich (EUA, 2008), que radicalizam a estetização da História Positivista em seu sentido mais espetacular por meio de um aparato de efeitos ultra-realistas. Tudo é hiperbólico, o desenho da realidade é composto por exageradas camadas de técnica, reforçando grandes feitos, o momento da inscrição dos nomes das personagens na história: abandona-se a sobriedade científica para se instituir um universo supra-real, onde a violência, por exemplo, não se limita aos tiros ou ao sofrimento, mas desemboca num mundo cuja morte só é assegurada pela destruição completa dos corpos (SARLO, 2007) e pelo <i>close-up</i> nos restos humanos. A leitura da história se desfia como uma aventura composta de superações sucessivas de desafios e obstáculos, baseada em explicações superficiais e conduzida num ritmo frenético e de baixa complexidade cognitiva: os protagonistas são nomes conhecidos ou anônimos embrutecidos de heroísmo inscritos em eventos memoráveis no que se convencionou ser a história da humanidade. As produções seguem uma lógica funcional da causa e consequência, numa estrutura mastigada, onde se atribui extrema importância aos “atos, palavras e atitudes de alguns personagens, agrupados em uma cena de duração relativamente curta, em que se concentram, como na tragédia clássica, todas as forças da crise do momento” (BLOCH, 2011, p. 70).</div>
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No entanto, inúmeros filmes, seguindo preceitos da Microhistória e dos Estudos Culturais, desmistificam a histórias dos grandes feitos, dos líderes imponentes e célebres, muitas vezes menosprezando suas figuras ou transferindo o recorte para desconhecidos, para a vida cotidiana minimalista, para lugares esquecidos, se dedicando <i>às singelas histórias que acontecem enquanto a grande história se desenrola paralelamente</i>. Um exemplo básico é a trilogia do russo Aleksander Sokurov sobre os grandes chefes de Estado do século XX: <i>O Sol</i> (2005) retrata a intimidade do imperador Hirohito esboçando-o como um bobo lunático, engraçado e temeroso em momentos de risco; em <i>Moloch</i>, (1999) Hitler saltita em brincadeiras lascivas com sua mulher e revela medos infantis; já em <i>Taurus</i> (2001), Lênin vive seus últimos dias sob ajuda de terceiros, fraco, caquético, diferente do empenho com que o associamos pela Revolução de 1917. Sokurov conduz os espectadores a reconsiderarem a confiança que depositaram nas imagens, a confusão entre a dimensão do líder e da nação, alertando para a influência de um século estetizado sobre a nossa memória e cultura. O diretor também procura destituir os grandes líderes dos grandes atos, desmistificando suas imagens por meio de ações absolutamente banais. Sua leitura pessoal do passado desperta para a potência do audiovisual em desconfiar desse armazenamento de visões clichês do passado, estimulando os espectadores a invadirem a história monumental com suas versões alternativas e espaços de subjetividade. </div>
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Talvez a mais famosa história nesse sentido seja a de Anja Rosmus, mulher alemã que inspirou o filme <i>A Cidade Sem Passado</i> (Alemanha, 1990), de Michael Verhoeven, que ainda durante a escola começou a pesquisar sobre a sua cidade natal, que oficialmente foi palco de um campo nazista de trabalhos forçados, firmando-se ao longo das décadas como um dos poucos símbolos de resistência ao nazismo dentro da própria Alemanha. No entanto, a garota não conseguiu investigar o bastante para escrever a redação <i>Minha cidade durante o Terceiro Reich</i>, recebeu conselhos da mãe alertando para só falar coisas positivas, produzindo um material raso, afinal sua entrada não havia sido permitida nos arquivos municipais e aparentemente os líderes mais velhos – executivos, políticos, padres e professores – não conseguiam lembrar o período citado. Havia uma espécie de amnésia coletiva e provocada. Já na universidade, cursando História, essa mesma mulher decidiu voltar ao assunto e durante suas pesquisas preliminares, descobriu um jornal local da época da Segunda Guerra Mundial, cujo editorial defendia todos os preceitos de Adolf Hitler. Inesperadamente, ela se deu conta que o texto havia sido escrito por um de seus professores eméritos e, assim, foi novamente aos arquivos, encontrando uma série de barreiras: “primeiro, dizem que os arquivos estão emprestados; depois, que estão velhos e esfarelados demais para serem usados; mais tarde, que o material diz respeito a pessoas que ainda estão vivas, cuja privacidade não pode ser violada” (ROSENSTONE, 2010, p. 34). </div>
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Ao perceber que seu trabalho estava sendo obstruído, Anja Rosmus processou a cidade e ganhou o direito de entrar nos espaços, descobrindo em seguida que os documentos haviam desaparecido. Ela, contudo, não desistiu e aos poucos foi colhendo vestígios que confirmavam suas suspeitas: empreendedores judeus foram denunciados por alguns dos líderes empresariais e eclesiásticos de sua cidade natal, alguns foram mortos, outros viveram em campos de trabalhos forçados e inúmeros foram submetidos a experiências médicas. Toda produção jornalística pós-guerra que colocava o município como um símbolo de resistência havia sido resultado de uma ação coletiva dos moradores para reescrever a história, transformando os algozes ainda vivos numa espécie de heróis fantasmas (ação coletiva semelhante a que possibilita a narrativa de <i>A Vila</i> (EUA, 2004), de M. Night Shayamalan). Vários chegavam a relatar seus grandes feitos pelos judeus durante o conflito, quando, na verdade, tinham arremessado tijolos nas casas de quem tentava ajudá-los. <br />
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<b>Alegorias do Presente</b><br />
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Como nos diz Walter Benjamin, “a história é um objeto de uma construção cujo lugar não é o tempo homogêneo e vazio, mas um tempo saturado de 'agoras'” (1994, p. 229/230), e assim sendo, o cinema desenvolveu intricadas relações de presentificação do passado, conduzidas de maneiras completamente diferentes: constata-se que “recorremos a imagens de um passado que são, cada vez mais, imagens daquilo que é mais recente” (SARLO, 2005, p. 96) ou que se apóiam na recapitulação de contextos históricos para refletirem disfarçadamente sobre dilemas da própria atualidade (XAVIER, 2004). Nesse sentido, é indispensável saber em que presente se narra, em que presente se rememora e qual o passado que se recupera (SARLO, 2007), destacando o papel da narrativa nessas intermediações e considerando que o tempo / contexto da enunciação se assenta enquanto base da estrutura do discurso e da estética. É possível tanto olhar para as décadas anteriores enquanto se reflete abertamente sobre o fim do século XX, como fincar observações que não são nem da época retratada nem do contexto do retratista, mas cujo fluxo repousa no encontro disjuntivo de ambas temporalidades. </div>
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Também nesse campo se encontram as mudanças de olhares sobre um mesmo fato a partir do alinhamento de alguns filmes, traçando uma ontologia da discordância, que não apenas reforça a crise da interpretação, como revela a articulação valorativa em permanente mudança a partir do presente que se desloca. A história possui um caráter renovável e contemporâneo, como tão bem percebem autores como Hayden White e Robert Rosenstone. Complementando essa busca teórica, vale lembrar das produções que ganharam novos significados no decorrer dos anos, levando em conta que os espectadores podem ler “de maneiras diferentes ou mesmo inversas, em dois momentos de sua história” (FERRO, 1992, 18). Identificam-se, projetam-se e rejeitam a seguir, consideram progressista, pacifista, depois limitado, paranóico. Talvez a chave seja descartar o pressuposto de que "cada época apresenta-se como totalmente nova”, investindo no preceito que ainda assim cada época “inventa um passado também novo" (CLAIR, 2008, p. 39), quebrando o nexo causal da história, por nexos conduzidos por diferentes orientações, estabelecendo conexões afetivas entre épocas distintas, fundando o “presente como um agora no qual se infiltraram estilhaços do messiânico” (BENJAMIN, 1992 p. 232). </div>
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Essa discussão pode ser observada através de uma breve análise da recepção do filme <i>A Grande Ilusão </i>(França, 1937), de Jean Renoir cuja intenção inicial era se firmar como uma obra pacifista ao criar uma certa cordialidade entre franceses e alemães durante a Primeira Guerra Mundial, quando um grupo da primeira nação terminava prisioneiro no território da segunda. Diante da iminente tensão na Europa, o cineasta pretendia criticar as guerras através do conflito humano aproximado, mas depois do início do conflito em 1939 e especialmente depois da ocupação nazista na França, da resistência e da colaboração, a mesma produção passou a ser observada como colaboracionista pelos franceses e perigosa pelos alemães. Em particular por causa de uma cena em que os oficiais alemão e francês, ambos de origem nobre, conversam em pé de igualdade, mesmo um sendo prisioneiro do outro, gerando uma inevitável sensação de comentário adaptado sobre a realidade do momento. Após a Segunda Guerra Mundial, o filme de Renoir, que chegou a ser considerado perdido após um bombardeio, voltou a ser considerado pacifista por ambos os lados, mas assumindo desde então uma ambiguidade histórica desconcertante. </div>
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Esse tomo também abarca uma discussão sobre nostalgia, recordações e testemunhos, focando especificamente na mistura de contextos históricos com contextos afetivos particulares, uma visão do passado onde a grande história é vista por pontos minimalistas, revalorizando a dimensão do 'eu' baseada na própria experiência dos cineastas e confundindo estruturas de consciência externas e internas. Trata-se do cinema que toma uma vida como referência, considerando que o passado “se refere, em concorrência, a memória e a história, porque nem sempre a história consegue acreditar na memória, e a memória desconfia de uma reconstituição que não coloque em seu centro os direitos da lembrança” (SARLO, 2007, p. 9). A discussão parte da trajetória que atravessa a temporalidade onde a lembrança se ergue até o ponto ao qual se refere, considerando que não há testemunho sem experiência, como tampouco há experiência sem narração, afinal “a narração inscreve a experiência numa temporalidade que não é a de seu acontecer, mas a de sua lembrança” (SARLO, 2007, p. 24/25). Além disso, é necessário resgatar a ideia de imaginário nostálgico, seja pelos vestígios inventados, pelo uso do passado como projeto utópico, criando muitas vezes máscaras no tempo, uma espécie de pós-memória, onde os detalhes e devaneios são resgatados das ruínas, podendo se transmutar em formas oníricas da representação mnemônica. Trata-se de um olhar cuja recriação perpassa não só “por nossas convicções apaixonadas, mas também pela experiência histórica que as formou” (HOBSBAWN, 1995, p. 15). </div>
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Em seus filmes <i>A Imortal</i> (França, 1963) e <i>O Homem que Mente</i> (França, 1968), Alain Robbe Grillet alfineta uma percepção histórica convencional, criando situações em que a mesquita X é a mais antiga da cidade, contudo foi destruída e reconstruída depois da guerra; filma esculturas que são do período helênico, mas foram produzidas há trinta anos; perpassa um cemitério dos servos de Constantino, mas cujas tumbas estão vazias, ninguém está enterrado sob aquela terra. O cineasta não cansa de sobrepor tempos coletivos e tempos individuais: “não olhei o relógio. Se tivesse olhado, descobriria que tinha menos de quatro horas para conhecê-la e talvez isso tivesse me desesperado. Como não olhei, escoei pelo presente”. Sua intenção é – especialmente no segundo filme, que conta a volta de um soldado, ora traidor, ora herói, para a sua aldeia – usar da palavra para inventar passados sobrepostos e reversíveis. O filme toma como ponto de partida os paradigmas de Proust e Bergson, colocando a memória como uma massa dinâmica, passível a transmutações a cada vez que nos apoderamos dela. Boris Varissa (Jean-Louis Trintignant) sobreviveu à experiência da guerra sob rostos emprestados, fincando que ao manejarmos sem controle reminiscências através do véu da ficção, estimulamos o desaparecimento das propriedades de ambas as dimensões, de modo que o movimento de voltar sempre, de lembrar sempre é também um movimento de deslocar sempre, como quem troca de lugar um tesouro dentro de um labirinto: moedas caem e novas moedas entram até que o tesouro se transforma. </div>
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<b>Ucronias e Anacronismos</b></div>
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Nesse último tomo, estão as reivindicações da dimensão subjetiva da arte de contar a história, dos diferentes compromissos a serem estabelecidos com a memória, ou seja, o espaço do cinema afirmar sua radical liberdade criativa diante da cobrança de fidedignidade ou verossimilhança, confrontando a confiança depositada nas imagens projetadas. A Ucronia se refere à transgressão absoluta sobre o que aconteceu, uma espécie de história alternativa, com outras consequências, a radicalização do caráter ficcional dentro do universo histórico. Para o crítico francês Paul Valéry, quando a história se apodera de nós e nos sentimos seduzidos a reviver uma aventura do passado, o interesse muitas vezes é sustentado “pelo sentimento de que as coisas poderiam ter sido completamente diferentes, poderiam ter acontecido de outra forma” (VALÉRY, p. 114). Assim, são englobados aqui todos os filmes que constituem suas narrações a partir da lógica do 'e se...', distorcendo o armazenamento canônico de informações ou usando de imagens de arquivo no intuito de metamorfosear sentidos e arquitetar um novo ambiente de narração. </div>
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O caso de <i>Bastardos Inglórios</i> (EUA, 2009), dirigido por Quentin Tarantino é bastante emblemático, pois não se trata de um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, mas um inventário do repertório cinematográfico de Tarantino; uma mistura do seu apelo cinéfilo pessoal com o imaginário audiovisual do conflito, forjado película a película, durante os últimos cinquenta anos. Mais uma vez o cineasta aponta para o próprio cinema, faz um filme de mediação tomando um evento histórico como pano de fundo para inundar a tela com suas referências. Traça, portanto, uma releitura do blaxploitation italiano <i>Quel Maledetto treno blindato</i> (1978), de Enzo Castellari, homenageia com a sua cena inicial <i>Era uma vez no Oeste</i> (1968), de Sérgio Leone, e numa sequência parodia <i>O Poderoso Chefão</i> (1972) com um Brad Pitt emulando descaradamente o Don Corleone de Marlon Brando. Tarantino é um detalhista convicto: recria cartazes de filmes da época, copia cabelos, refaz o vestido vermelho de Verônica Voss, revela suas paixões por meio da trilha sonora, pega de empréstimo expressões sutilmente sarcásticas. A narrativa acompanha dois planos para assassinar Hitler, o primeiro organizado por uma mulher judia dona de um cinema em Paris, outro planejado por um grupo de soldados judeus americanos, conhecidos como Bastardos Inglórios, movidos pela vingança. Famosos por quase não fazerem reféns, por terem ordens de matar cem nazistas para cada um, o grupo gera um temor nos oponentes por deixarem os raros sobreviventes marcados com uma suástica na testa. Aliás, o diretor norte-americano costura clichês e subversões de inúmeros gêneros, literalmente montando um filme de guerra por meio de recortes deslocados, vindos de épicos, de faroestes, da comédia, do melodrama e até mesmo do terror. O norte-americano propõe uma transgressão absoluta diante do compromisso com o campo histórico, o filme reforça uma imagem autônoma numa espécie de realidade paralela, um universo que trata de uma época sugerindo uma poética da possibilidade. <i>Bastardos Inglórios</i> não é um filme sobre a Segunda Guerra Mundial, mas uma colcha de retalhos audiovisuais do tempo que nos separa do próprio evento. </div>
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Esse tomo também envolve a questão do anacronismo, tanto como uma monumentalização desreferencializada, como num uso crítico, intempestivo e autoconsciente, tal como nas produções irmãs <i>Singularidades de uma Rapariga Loira</i> (Portugal, 2009) e <i>O Estranho Caso de Angélica </i>(Portugal, 2010), do diretor Manoel de Oliveira. O universo diegético criado pelo português amplia seu charme por meio da confusão temporal na qual se embala, pois não sabemos propriamente 'quando se passa', existem algumas referências recentes em Angélica – a crise econômica, a poluição – mas é como se o encadeamento de elementos "esquecidos" nos planos, os quadros, a mesa, os tapetes, as poltronas, estruturassem um antiquário reunindo e confluindo épocas distantes. Essa dimensão se intensifica graças aos diálogos saídos dos nossos avós, da moral flutuante, do próprio desejo do protagonista - amante das 'coisas antigas' – em retratar homens que aram suas terras com inchadas, não máquinas, resgatando um cotidiano negado até pelos que o ainda compartilham. As fotos reveladas, da Angélica do título morta e da morte de uma prática, repousam juntas no mesmo varal. Se formos adentrar um pouco pelos bastidores, saberemos que o argumento foi escrito ainda no final da década de 1940 e o filme parece agregar essa passagem de mais de sessenta anos em seus enquadramentos estáticos, calmos, de quem tem a curiosidade instigante do observar pelo observar. </div>
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Em <i>Rapariga Loira</i>, por sua vez, uma das cenas se passa não por acaso num antiquário: plano aberto da porta de entrada, penumbra que torneia a profundidade de campo e detalhes da multiplicidade de objetos postulados sob a astúcia do diálogo de tempos através deles. Seguindo o mesmo caminho, o primeiro encontro com direito a apresentação do futuro casal de protagonistas acontece numa sala de estar suntuosa em que cada canto parece saído de um ano diferente da <i>Era Moderna</i> - incluindo os próprios rituais, as condutas, a leitura do poema, os figurinos, a mulher tocando harpa, a cortina da época de Goethe, os sapatos engraxados, o leque oriental da rapariga loira. O anacronismo afetivo e delicado de Oliveira nos concede a chance de nos desapegarmos e formalizarmos o não pertencimento exclusivo a uma única geração, a um bojo de referências restritas, nos revestindo de uma fluidez ao ponto de desenvolvermos (ou cortarmos) fios umbilicais com autores e épocas que não as contíguas ou infantis, libertando alegremente nossos desejos no vasto campo das idiossincrasias da história da humanidade.
Assim são os filmes que funcionam como um antiquário, quebrando as fronteiras das temporalidade dos objetos e personagens, constituindo uma narrativa onde se “acumulam em desordem objetos profanos e sagrados, selvagens e civilizados, antigos e modernos, que resumem, cada um, um mundo” (RANCIÈRE, 2005, p. 56) e que unidos geram uma provocação política. Não se pode perder a oportunidade de também problematizar a ausência completa de referências históricas por parte das plateias massificadas, que consomem imagens ficcionais como verdade absoluta, restabelecendo cegamente uma cobrança de realismo dentro do ficcional, expondo uma alienação crescente ao ponto de se perguntarem, por exemplo, se Hitler havia morrido dentro de um cinema em chamas como nos mostrou Tarantino em <i>Bastardos Inglórios</i> ou se o ambiente de <i>Maria Antonieta</i> fora fidedignamente representado no filme homônomo da Sofia Coppola.
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Nós, estudantes da década de 60, aprendemos como descobrir fatos e, depois, usá-los para criar narrativas acerca do passado, narrativas cujas verdades subjacentes não questionávamos. Jamais aprendemos algo acerca do que podia se introduzir sorrateiramente naquelas narrativas porque estávamos escrevendo uma forma literária que tinha suas próprias exigências. Jamais aprendemos que o tipo de história que estávamos fazendo era apenas uma maneira de abordar a verdade do passado. Sabíamos que o que havíamos aprendido a escrever era a história real. Sem dúvida, teríamos ficado chocados se alguém tivesse dito que as verdades sobre o passado podiam ser expressas na tela, no cinema ou na televisão (ROSENSTONE, 2010, p. 20)
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<b>Considerações Finais</b><br />
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O presente artigo, parte de uma pesquisa que ainda se encontra num estágio inicial, acopla-se a toda discussão no campo historiográfico no sentido de resgatar o que os historiadores escreveram sobre seus próprios ofícios e assimilando o que comentadores escreveram sobre os ofícios destes mesmos historiadores para, então, articular seus aportes teóricos e metodologias com as narrativas cinematográficas contemporâneas. Claro que dentro desse processo, destaca-se a <i>Escola dos Annales</i>, seus mentores Marc Bloch e Lucien Febvre, a partir da segunda década do século passado, a segunda geração com Fernand Braudel e as décadas que resultaram na Nova História, reunindo nomes como Jacques Le Goff, Marc Ferro, Roger Chartier, Michel de Certeau e Pierre Nora. Mais recentemente, como representante de uma perspectiva pós-moderna, temos Hayden White e Robert Rosenstone. A pesquisa se preocupa em considerar a importância dos historiadores terem tomado “consciência de que toda história é sempre construída a partir de fórmulas que direcionam a produção das narrativas” (MAINENTE; GAGLIARDO, 2010, online) e que o fazer histórico está intimamente ligado às regras peculiares do regime estético. </div>
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Além de questionar os preceitos da lógica causal ou rigidamente científica, os autores dessas correntes, especialmente no último estágio, iniciaram a defesa do caráter inventivo e ficcional contido nas narrativas históricas, influência de contextos de onde partiam a enunciação, a partir das recorrentes discordâncias de leituras de eventos por parte dos historiadores ao longo de décadas. Aprofundaram-se, assim, as disputas historiográficas no nível da interpretação, reunindo dinâmicas exclusivas do fazer artístico, comparando a história ao romance, o que deu respaldo aos profissionais passarem a considerar a influência crescente da estética em suas próprias práticas e reforçarem em suas obras uma espécie de autoconsciência lingüística, o que a Beatriz Sarlo chamou de ‘guinada subjetiva da história’ (2007). Portanto, essa experiência epistemológica identifica os componentes estruturais, os modelos de narração e as motivações de filmes que recriam um passado cuja coerência é imaginária, mas que, ainda assim, carregam comentários precisos sobre a realidade e a relação entre presente e passado a partir dos processos de estetização dos fatos e trajetórias, pois os filmes sempre escondem em sua natureza poética uma perspectiva histórica.<br />
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<b>Referências Bibliográficas</b></div>
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BLOCH, Marc. <b>Apologia da História ou o ofício do Historiador.</b> Rio de Janeiro: Jor Zahar, 2011.
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<div style="text-align: justify;">
CAPELATO, Maria Helena et al. (orgs.). <b>História e cinema: dimensões históricas do audiovisual.</b> São Paulo: Alameda, 2007.
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<div style="text-align: justify;">
FEYERABEND, Paul. <b>Contra o Método.</b> Rio de Janeiro: F. Alves, 1977.
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NIETZSCHE, Friedrich. <b>Segunda consideração extemporânea ou intempestiva. Da utilidade e desvantagem da história para a vida.</b> Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2003.
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RANCIÈRE, Jacques. <b>A partilha do sensível: estética e política.</b> São Paulo: Ed. 34, 2005.
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ROSA, Guimarães. <b>Grande Sertão: Veredas.</b> Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.
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ROSENSTONE, Robert. <b>Visions of past: the challenge of film to our idea of history.</b> Cambridge: Harvard College, 1995.
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____________________ <b>História nos filmes / Filmes na história.</b> São Paulo: Paz e Terra, 2010.
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SARLO, Beatriz. <b>Tempo Presente. Notas sobre a mudança de uma cultura.</b> Rio de Janeiro: José Olímpio, 2005. </div>
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______________ <b>Tempo Passado. Cultura da memória e guinada subjetiva.</b> São Paulo: Companhia das Letras; Belo Horizonte: UFMG, 2007.
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VALÈRY, Paul. <b>Impressões sobre a história.</b> IN Variedades. São Paulo: Iluminuras, 2007.
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WHITE, Hayden. <b>Trópicos dos discursos. Ensaios sobre a crítica da cultura.</b> São Paulo, EDUSP, 1994.</div>
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______________ <b>Meta-história. A imaginacão histórica do século XIX.</b> São Paulo, EDUSP, 1995.
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XAVIER, Ismail. <b>Alegorias da História </b>IN RAMOS, Fernão (Org.). <b>Teoria contemporânea do cinema. Pós-estruturalismo e filosofia analítica.</b> São Paulo: Editora Senac, 2004.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-67172557779934325892013-10-22T16:14:00.002-03:002013-10-22T16:14:51.210-03:00três versos curtos sobre recifeo rio é podre,<br />
a praia tem tubarão,<br />
os postes dão choque.Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-40074100318561612602013-10-02T19:02:00.001-03:002013-10-02T19:24:26.812-03:00Suspeita<div style="text-align: justify;">
Confesso que nas últimas semanas tenho carregado em silêncio uma triste suspeita: acreditariam, os cineastas, que seus filmes ~provocadores~ sobre a cidade em que vivem são mais importantes que as (inspiradoras) demandas reais desta mesma cidade? Ainda não estou convencido, mas a suspeita logo ganhou corpo através de uma cena, a última de <i>A Mulher das Dunas</i>:<i> </i>depois de<i> </i>fugir de sua algoz, libertar-se da fechadura e atravessar um deserto, o homem encontra um mar revolto e infinito, com ondas resistentes e coletivas, um mar que parece mais a metáfora de um sonho; mas, então, o homem decide voltar para o seu cativeiro, decide passar o resto de seus dias brincando com o seu balde d'água, no qual pode controlar as ondinhas com as suas próprias mãos. Certo de que o cinema é mais importante que a vida, o homem termina conformado em sua condição.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-32636882084484305302013-08-05T19:39:00.000-03:002013-10-02T19:40:13.427-03:00Estudo em Vermelho (Brasil, 2013), de Chico LacerdaMais um filme dos coletivos <a href="https://www.facebook.com/SurtoFilmes?fref=ts" target="_blank">Surto</a> & <a href="https://www.facebook.com/Deslumbramento?fref=ts" target="_blank">Deslumbramento</a>.<br /><br /><iframe allowfullscreen="" frameborder="0" height="300" src="//www.youtube.com/embed/zEifGxdkF3A" width="510"></iframe>Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-46419761684314867322013-07-18T20:45:00.004-03:002013-07-24T03:14:05.294-03:00Ossada<div style="text-align: justify;">
A matéria televisiva sobre a ossada encontrada nas escavações do túnel na frente do Museu da Abolição, supostamente de um judeu com cerca de 500 anos, supostamente antes do ultimato de deixarem o país em 1634, pareceu-me uma cena suecada de <i><a href="http://velhoshabitos.blogspot.com.br/2010/05/cidades-de-invencao.html" target="_blank">Em construção</a> </i>(Espanha, 2001), do espanhol Jose Luis Guerin. Incrível como diante de uma descoberta dessa magnitude histórica, todo mundo se sente estimulado a comentar ou fabular sobre o passado abaixo de nossos pés: uma época distante e silenciada parece ressurgir plena de uma estranha intimidade. Não tive muita paciência para as falas dos especialistas (aliás, as obras do túnel deveriam ser interditadas, não?); o bom mesmo veio dos curiosos, cada qual tocando da sua maneira mambembe ~engenhos, escravos, bondes, índios, mucambos ~ nas sobreposições de tempos e cidades. Segundo a minha mãe que estava vendo a matéria ao meu lado, por exemplo, a vila aqui da Várzea onde ela mora foi construída em cima de um cemitério de escravos. Não duvido 100% porque essa região era toda repartida por engenhos, tinha a capela dos brancos, dos pardos e dos negros (as duas primeiras sobreviveram, a última foi incendiada), mas tenho a impressão de que aprendi na minha infância - estudávamos a história de nosso bairro na escolinha construtivista - que o espaço da vila se transformou num cemitério dos portugueses e índios mortos na Batalha dos Guararapes. Acho que isso se torna mais verossímil, porque o Engenho São João, onde supostamente se tramavam as revoltas contra os holandeses, ficava na Várzea e Filipe Camarão, o líder índigena e uma das figuras mais importantes desse processo, certamente está enterrado na Igreja Matriz aqui pertinho. Errrr... falou e disse mais um curioso que teve algumas aulas sobre o assunto na terceira série.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-30860532540708747542013-07-18T19:15:00.002-03:002013-07-18T19:15:46.586-03:00Cinema e Memória<div style="text-align: justify;">
Nos últimos meses estive engajado na viabilização do e-book <i>Cinema e Memória</i>, que acaba de ser lançado pela Editora Universitária da UFPE, através do Programa de Pós-Graduação em Comunicação, movimento que posso considerar como o primeiro passo de minha pesquisa de doutorado. Além do meu artigo, a publicação conta com textos dos outros dois organizadores, Carlos André Carvalho e Chico Lacerda, e dos colaboradores André Antônio, Isabel Marinho, Nina Velasco, Marcelo Costa e Sabrina Tenório Luna. Nosso intento com esse e-book foi esquadrinhar as relações entre os dois campos, utilizando distintos objetos e arcabouços teóricos, percebendo como a sétima arte além de resgatar uma memória, exerce a memória, muitas vezes engendrando contraditórias concepções historiográficas, deslocando passados, jogando com formas de experiência e mobilização. Segue abaixo a capa com o link e desejo a todos os interessados uma boa leitura!</div>
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<a href="http://www.ufpe.br/editora/ufpebooks/outros/cine_memoria/" target="_blank"><img border="0" height="640" src="http://1.bp.blogspot.com/-xk1vNajDnoA/UehoJ7QwspI/AAAAAAAACHw/UtXuOsZh1H4/s640/Captura+de+Tela+2013-07-18+a%CC%80s+19.24.03.png" width="448" /></a></div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-87547315673596672252013-07-12T09:57:00.000-03:002013-07-20T18:11:12.607-03:00Caixa Eletrônico<div style="text-align: justify;">
Antes de repassar as finanças para o síndico, o porteiro mais antigo do prédio <i>Piazza di Verona</i> costumava organizar e fechar os pagamentos do condomínio depois do anoitecer do quinto dia útil de cada mês. Romão, morador de apenas um ano num lugar de inquilinos de longa data; rapaz jovem, forte, peludo e relapso com os trâmites e miudezas do dia-a-dia, tinha esquecido pela sétima vez o dia do vencimento, de forma que acordou num salto do cochilo pós-almoço, cochilo pesado depois da dobradinha oferecida na casa de uma ex-namorada. Não a última ex, outra. Despediu-se com um forte abraço e com a rapidez que a dupla situação necessitava, correu para a parada de ônibus, esperou meia hora, passou seu cartão de trabalhador, ficou em pé, trânsito, mais trânsito, novamente mais trânsito, desceu cinquenta minutos depois, a chuva começou a cair, abriu uma sombrinha roxa emprestada pela mãe, os arames estalavam a cada vento mais forte e seguiu para o supermercado mais próximo de seu prédio, onde existiam alguns caixas-eletrônicos. Com o céu cinza, sem relógio ou celular, não sabia bem a hora, também não estava disposto a parar alguém na chuva para perguntar. Subindo a ladeira de acesso ao centro de compras, Romão percebeu que as luzes estavam falhando, acendendo e apagando, silenciosamente desejou a estabilidade, mas quando se aproximou da porta eletrônica, com ela quase fechando, as luzes se apagaram em definitivo. O rapaz foi invadido por um pensamento permeado pelo desespero e pelo ódio: "a porta é eletrônica, caso não abra manualmente, vou atrasar a taxa de condomínio, mas a multa vai valer a pena porque vou postar no Facebook o absurdo que é uma porta ser eletrônica e não funcionar manualmente, porque se fosse um incêndio lá dentro, as pessoas ficariam impossibilitadas de sair e morreriam todas queimadas". A porta funcionava no manual, bastava empurrar e, nem foi preciso, porque o gerador foi prontamente acionado, fazendo com que todas as luzes retornassem e a porta abrisse quando Romão chegou perto. De imediato, o rapaz entrou na fila de seu banco, com aqueles movimentos similares de quem está se mijando, percebendo em seguida, para sua sorte, acreditava, que nenhum dos caixas-eletrônicos tinham apagado durante a falha de energia. Exceto pelo caixa 24h, o único em que ninguém esperava na fila. No banco de Romão, apenas duas pessoas na sua frente: uma utilizando o caixa e a outra esperando. Nos outros três bancos, as filas eram maiores. Enquanto aguardava a sua vez, olhou as pessoas para ver se valia a pena ficar encarando alguém, não valia, então Romão ficou observando o sistema do caixa 24h reiniciar, processo demorado, muitos e muitos minutos se passaram, tempo suficiente para a velhinha que estava usando o seu caixa errar dez vezes e conseguir realizar um saque na décima primeira. Uma garota se aproximou do tal caixa, olhou, esperou um tempinho, atendeu o telefone e foi embora. O sistema continuava a reiniciar, mantendo um aviso em vermelho na tela, enquanto a mulher na sua frente imprimia extratos sem fim. Quando finalmente ela saiu, Romão já foi enfiando seu cartão, tentando ser o mais rápido possível. Duas pessoas entraram na sua fila. O sistema do 24h continuava a reiniciar. O rapaz foi realmente veloz, tirou o dinheiro e, antes de prosseguir em sua correria, resolveu conferir as notas e certificar se o valor batia com o solicitado. Quando na sua contagem estava entre os R$ 150 e R$ 200, o caixa ao lado fez aquele barulho típico de que vai soltar dinheiro. Todos os usuários de todas as filas olharam apreensivos, esperando saber se algum dinheiro seria cuspido e como se comportariam depois disso. De quem seria aquele dinheiro? Dividiríamos? Devolveríamos? Decidiríamos na porrada? No final, nada saiu, a tela ficou preta com um aviso permanente: "sistema inoperante". Romão agradeceu. Sua taxa de condomínio dentro do vencimento foi, por muito pouco, salva de dilema um moral.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-71109291143501188112013-07-09T14:24:00.000-03:002013-07-11T12:06:51.874-03:00Imagens de Valerio Zurlini<div class="separator" style="clear: both; text-align: justify;">
Recentemente participei de um <a href="http://www.filmologia.com.br/?p=6777" target="_blank">especial</a> sobre Valerio Zurlini na Revista Filmologia e, assim como fiz há quase dois anos durante a edição sobre <a href="http://velhoshabitos.blogspot.com.br/2011/08/imagens-de-philippe-garrel.html" target="_blank">Philippe Garrel</a>, enquanto percorria a filmografia do cineasta italiano, fui salvando sistematicamente imagens, pensando em criar posteriormente uma sequência com os quadros guardados. Destaquei nos ensaios que escrevi sobre <i>Mulheres no Front </i>e <i>A Primeira Noite de Tranquilidade, </i>que<i> </i>o cinema do <i>Príncipe da Melancolia</i>, cujos ciclos cinéfilos injustamente julgaram por anos como um cinema sub-Antonioni, apreende sua potência nos olhos enquadrados pela câmera, olhos escondidos atrás de corpos, olhos abertos, fechados, semicerrados; olhares trocados como fragrâncias do corpo, contemplando o - ou compartilhando do - sofrimento do outro, (d)a doença, (d)a paixão, (d)a indiferença, (d)a falta de forças para seguir adiante. Se numa entrevista, Zurlini sublinha a visão pessimista de suas obras, afirmando que "é inútil amar porque amar implica infelicidade, é inútil acreditar em alguém, porque nos desiludiremos", o crítico italiano Gian Piero Brunetta complementa dizendo que "desde logo, seu cinema se revelou capaz de fazer falar o olhar e a expressão de seus personagens, de preencher o silêncio de emoções, de jogar com o não dito, com uma intensidade de sentimentos mínimos, de atmosferas suspensas, de jogar, de modo magistral, com cordas íntimas".</div>
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<a href="http://1.bp.blogspot.com/-j3DsXhR_UH0/UdwaAP8cCEI/AAAAAAAACAk/7GoliY_rfSY/s1600/1.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://1.bp.blogspot.com/-j3DsXhR_UH0/UdwaAP8cCEI/AAAAAAAACAk/7GoliY_rfSY/s640/1.png" width="511" /></a></div>
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<a href="http://1.bp.blogspot.com/-btFOmRF36So/UdwaLq4AVQI/AAAAAAAACDA/B2AodK0U_0M/s1600/2.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://1.bp.blogspot.com/-btFOmRF36So/UdwaLq4AVQI/AAAAAAAACDA/B2AodK0U_0M/s640/2.png" width="511" /></a></div>
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<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-vE3FhWoSsjg/UdwaR_sKxaI/AAAAAAAACD8/_0bWEqYyFsM/s1600/3.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://3.bp.blogspot.com/-vE3FhWoSsjg/UdwaR_sKxaI/AAAAAAAACD8/_0bWEqYyFsM/s640/3.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-yHZvtrIeW28/UdwaVL6S9yI/AAAAAAAACFA/nQPWLvTf7Jg/s1600/4.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://2.bp.blogspot.com/-yHZvtrIeW28/UdwaVL6S9yI/AAAAAAAACFA/nQPWLvTf7Jg/s640/4.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-uIoP67dnTHk/UdwabpdLplI/AAAAAAAACGY/GlBx3T2vLHg/s1600/5.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="283" src="http://4.bp.blogspot.com/-uIoP67dnTHk/UdwabpdLplI/AAAAAAAACGY/GlBx3T2vLHg/s640/5.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-jQp8H5n7_0o/Udwad8MmquI/AAAAAAAACG0/hLoRyfM-zFA/s1600/6.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="278" src="http://2.bp.blogspot.com/-jQp8H5n7_0o/Udwad8MmquI/AAAAAAAACG0/hLoRyfM-zFA/s640/6.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-5sjWNuZP5Eg/UdwaeH8z0DI/AAAAAAAACG4/ctxrsPvX-II/s1600/7.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://4.bp.blogspot.com/-5sjWNuZP5Eg/UdwaeH8z0DI/AAAAAAAACG4/ctxrsPvX-II/s640/7.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-8q7bDzjKPYQ/UdwafEKrlgI/AAAAAAAACHE/TZEEwVo0Pnw/s1600/8.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://3.bp.blogspot.com/-8q7bDzjKPYQ/UdwafEKrlgI/AAAAAAAACHE/TZEEwVo0Pnw/s640/8.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-4Pzrh3gu3Oo/UdwafQ2YebI/AAAAAAAACHM/VEdzygh8rzQ/s1600/9.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://4.bp.blogspot.com/-4Pzrh3gu3Oo/UdwafQ2YebI/AAAAAAAACHM/VEdzygh8rzQ/s640/9.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-frtJrLSDAiw/UdwaBZGVLqI/AAAAAAAACA4/GBg2vlJUQlM/s1600/10.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="368" src="http://3.bp.blogspot.com/-frtJrLSDAiw/UdwaBZGVLqI/AAAAAAAACA4/GBg2vlJUQlM/s640/10.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-PNkk5VO3HgA/UdwaALm_gGI/AAAAAAAACAo/Gl3-RIf_enY/s1600/11.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="368" src="http://4.bp.blogspot.com/-PNkk5VO3HgA/UdwaALm_gGI/AAAAAAAACAo/Gl3-RIf_enY/s640/11.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-URDq4WkEIgg/UdwaC75OZrI/AAAAAAAACBQ/01O31_RA3po/s1600/12.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="368" src="http://1.bp.blogspot.com/-URDq4WkEIgg/UdwaC75OZrI/AAAAAAAACBQ/01O31_RA3po/s640/12.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-L_-FqcQ-0VQ/UdwaBfdLcyI/AAAAAAAACA0/LPsh4pZnsRQ/s1600/13.1.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="293" src="http://4.bp.blogspot.com/-L_-FqcQ-0VQ/UdwaBfdLcyI/AAAAAAAACA0/LPsh4pZnsRQ/s640/13.1.jpg" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-tNB8oztWO_Y/UdwaCmmLy1I/AAAAAAAACBE/QxsBH6yAXQo/s1600/13.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://2.bp.blogspot.com/-tNB8oztWO_Y/UdwaCmmLy1I/AAAAAAAACBE/QxsBH6yAXQo/s640/13.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-dKXpGC7S4SY/UdwaC2S-ZvI/AAAAAAAACBI/Wwr7RLl2s-8/s1600/14.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="278" src="http://4.bp.blogspot.com/-dKXpGC7S4SY/UdwaC2S-ZvI/AAAAAAAACBI/Wwr7RLl2s-8/s640/14.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-T0kt3FHpHUg/UdwaD1W_ETI/AAAAAAAACBc/dWMfQeC43-Y/s1600/15.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="278" src="http://3.bp.blogspot.com/-T0kt3FHpHUg/UdwaD1W_ETI/AAAAAAAACBc/dWMfQeC43-Y/s640/15.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-8fGu9HKAknc/UdwaELBzQ-I/AAAAAAAACBo/LnbgkjlXQ_Y/s1600/16.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://4.bp.blogspot.com/-8fGu9HKAknc/UdwaELBzQ-I/AAAAAAAACBo/LnbgkjlXQ_Y/s640/16.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-AcZQjH9SVeA/UdwaEGq6NAI/AAAAAAAACBg/74vHlKnYqLQ/s1600/17.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://1.bp.blogspot.com/-AcZQjH9SVeA/UdwaEGq6NAI/AAAAAAAACBg/74vHlKnYqLQ/s640/17.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-twUuHM9Jf7w/UdwaHGJ19NI/AAAAAAAACCI/sv1iCxLyOz0/s1600/18.1.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="370" src="http://1.bp.blogspot.com/-twUuHM9Jf7w/UdwaHGJ19NI/AAAAAAAACCI/sv1iCxLyOz0/s640/18.1.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-D691ea7P89U/UdwaEpiP9mI/AAAAAAAACBs/eshrRc3ATts/s1600/18.2.jpeg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="276" src="http://1.bp.blogspot.com/-D691ea7P89U/UdwaEpiP9mI/AAAAAAAACBs/eshrRc3ATts/s640/18.2.jpeg" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-x-qsZCn0KNw/UdwaF8IQm-I/AAAAAAAACB8/90D0Z0vfKpQ/s1600/18.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://3.bp.blogspot.com/-x-qsZCn0KNw/UdwaF8IQm-I/AAAAAAAACB8/90D0Z0vfKpQ/s640/18.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-4xCzH6Tmj6g/UdwaHAhMhmI/AAAAAAAACCE/M7xEp8hQt8M/s1600/19.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="276" src="http://1.bp.blogspot.com/-4xCzH6Tmj6g/UdwaHAhMhmI/AAAAAAAACCE/M7xEp8hQt8M/s640/19.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-ub82WYSOmWI/UdwaIucYxcI/AAAAAAAACCY/y3S9f6SPVXQ/s1600/20.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://1.bp.blogspot.com/-ub82WYSOmWI/UdwaIucYxcI/AAAAAAAACCY/y3S9f6SPVXQ/s640/20.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-XAVhcbON-Qw/UdwaIIeZKDI/AAAAAAAACCU/tcO_Z4RMzyo/s1600/21.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://4.bp.blogspot.com/-XAVhcbON-Qw/UdwaIIeZKDI/AAAAAAAACCU/tcO_Z4RMzyo/s640/21.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-ATUeRcx0cYE/UdwaJtt4MeI/AAAAAAAACCo/Gwl3vOJLECY/s1600/22.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://2.bp.blogspot.com/-ATUeRcx0cYE/UdwaJtt4MeI/AAAAAAAACCo/Gwl3vOJLECY/s640/22.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-lqIQL_ftcBM/UdwaJaFkzBI/AAAAAAAACCk/dJQqQh9bn1s/s1600/23.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://2.bp.blogspot.com/-lqIQL_ftcBM/UdwaJaFkzBI/AAAAAAAACCk/dJQqQh9bn1s/s640/23.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-uo2DO6XSA6w/UdwaLGM5YSI/AAAAAAAACC0/9iCUP6CXL1Q/s1600/24.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="276" src="http://2.bp.blogspot.com/-uo2DO6XSA6w/UdwaLGM5YSI/AAAAAAAACC0/9iCUP6CXL1Q/s640/24.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-PnRLbF_RnXA/UdwaLnpnc8I/AAAAAAAACC8/L7pJ5qXhsYQ/s1600/25.1.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://3.bp.blogspot.com/-PnRLbF_RnXA/UdwaLnpnc8I/AAAAAAAACC8/L7pJ5qXhsYQ/s640/25.1.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-9-CY9HAVtWs/UdwaMwBI8KI/AAAAAAAACDQ/q8EEBUc8u2I/s1600/25.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="276" src="http://4.bp.blogspot.com/-9-CY9HAVtWs/UdwaMwBI8KI/AAAAAAAACDQ/q8EEBUc8u2I/s640/25.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-Y5Pxdltk9D4/UdwaM9SONHI/AAAAAAAACDM/APWpI4_I0Uc/s1600/26.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://1.bp.blogspot.com/-Y5Pxdltk9D4/UdwaM9SONHI/AAAAAAAACDM/APWpI4_I0Uc/s640/26.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-bb2YnnCG3p8/UdwaOC_EfpI/AAAAAAAACDc/J9XE2SajGdg/s1600/27.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://4.bp.blogspot.com/-bb2YnnCG3p8/UdwaOC_EfpI/AAAAAAAACDc/J9XE2SajGdg/s640/27.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-SPtaLL0wxcU/UdwaO8ZEriI/AAAAAAAACDo/2YkQZtkm5n0/s1600/28.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="276" src="http://4.bp.blogspot.com/-SPtaLL0wxcU/UdwaO8ZEriI/AAAAAAAACDo/2YkQZtkm5n0/s640/28.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-VUXDS0AYGcM/UdwaO4IWlBI/AAAAAAAACDk/CzoEyGV1FL0/s1600/29.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://3.bp.blogspot.com/-VUXDS0AYGcM/UdwaO4IWlBI/AAAAAAAACDk/CzoEyGV1FL0/s640/29.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-AgzIDXf5sak/UdwaQV5K3rI/AAAAAAAACD0/Kkx5gIbTThA/s1600/31.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://4.bp.blogspot.com/-AgzIDXf5sak/UdwaQV5K3rI/AAAAAAAACD0/Kkx5gIbTThA/s640/31.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-Q3ERT8I-rDc/UdwaR9-49xI/AAAAAAAACEA/o_5zxS7Y6H4/s1600/32.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="284" src="http://3.bp.blogspot.com/-Q3ERT8I-rDc/UdwaR9-49xI/AAAAAAAACEA/o_5zxS7Y6H4/s640/32.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-4aDhQybbChw/UdwaSGMVT7I/AAAAAAAACEE/FdlsbwVYQT4/s1600/33.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://2.bp.blogspot.com/-4aDhQybbChw/UdwaSGMVT7I/AAAAAAAACEE/FdlsbwVYQT4/s640/33.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-gDObkxWMIrQ/UdwaSWj2oaI/AAAAAAAACEM/uLcidfasA38/s1600/34.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="278" src="http://2.bp.blogspot.com/-gDObkxWMIrQ/UdwaSWj2oaI/AAAAAAAACEM/uLcidfasA38/s640/34.jpg" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-AeSZL7YZdIA/UdwaTrjk69I/AAAAAAAACEo/4XfeZoSRjms/s1600/35.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://4.bp.blogspot.com/-AeSZL7YZdIA/UdwaTrjk69I/AAAAAAAACEo/4XfeZoSRjms/s640/35.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-dj5Sd9q2BNo/UdwaTbqdsyI/AAAAAAAACEc/IHTGg_1zRiQ/s1600/36.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://4.bp.blogspot.com/-dj5Sd9q2BNo/UdwaTbqdsyI/AAAAAAAACEc/IHTGg_1zRiQ/s640/36.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-eG88joU6wps/UdwaTuHjw_I/AAAAAAAACEg/Gcb5DrI0S-0/s1600/37.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://4.bp.blogspot.com/-eG88joU6wps/UdwaTuHjw_I/AAAAAAAACEg/Gcb5DrI0S-0/s640/37.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-BsesVTYgDdc/UdwaU7n0pdI/AAAAAAAACE0/ttKeBCF3kHo/s1600/38.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://1.bp.blogspot.com/-BsesVTYgDdc/UdwaU7n0pdI/AAAAAAAACE0/ttKeBCF3kHo/s640/38.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-DChO4j7dmyM/UdwaU86ra9I/AAAAAAAACE4/YljCMzHIwgw/s1600/39.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://1.bp.blogspot.com/-DChO4j7dmyM/UdwaU86ra9I/AAAAAAAACE4/YljCMzHIwgw/s640/39.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-13_CEszMkRU/UdwaXCXvwFI/AAAAAAAACFc/MrtokNv5rp4/s1600/40.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://1.bp.blogspot.com/-13_CEszMkRU/UdwaXCXvwFI/AAAAAAAACFc/MrtokNv5rp4/s640/40.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-yoN2PSAtjYc/UdwaWa0IIHI/AAAAAAAACFM/dmEQsMuBgsQ/s1600/41.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="287" src="http://2.bp.blogspot.com/-yoN2PSAtjYc/UdwaWa0IIHI/AAAAAAAACFM/dmEQsMuBgsQ/s640/41.png" width="511" /></a></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-G8IFcqC7VtY/UdwaWR74WEI/AAAAAAAACFQ/txfSVQiO__0/s1600/42.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="298" src="http://3.bp.blogspot.com/-G8IFcqC7VtY/UdwaWR74WEI/AAAAAAAACFQ/txfSVQiO__0/s640/42.jpg" width="511" /></a></div>
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<a href="http://3.bp.blogspot.com/-KIsNOkfk2B4/UdwaYAG08QI/AAAAAAAACFo/X0kclPf0_gg/s1600/43.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://3.bp.blogspot.com/-KIsNOkfk2B4/UdwaYAG08QI/AAAAAAAACFo/X0kclPf0_gg/s640/43.png" width="511" /></a></div>
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<a href="http://3.bp.blogspot.com/-KAtsXHe0O1Y/UdwaXuAx7wI/AAAAAAAACFk/PdGQV2G9SVA/s1600/44.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="391" src="http://3.bp.blogspot.com/-KAtsXHe0O1Y/UdwaXuAx7wI/AAAAAAAACFk/PdGQV2G9SVA/s640/44.png" width="511" /></a></div>
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<a href="http://4.bp.blogspot.com/-559JJOgQlZI/UdwabEt--WI/AAAAAAAACGQ/9WfUarvQkks/s1600/45.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="276" src="http://4.bp.blogspot.com/-559JJOgQlZI/UdwabEt--WI/AAAAAAAACGQ/9WfUarvQkks/s640/45.png" width="511" /></a></div>
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<a href="http://1.bp.blogspot.com/-p-cNUKVwCRQ/UdwaZJ1yn0I/AAAAAAAACF0/PvBsiDxIGzU/s1600/47.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="284" src="http://1.bp.blogspot.com/-p-cNUKVwCRQ/UdwaZJ1yn0I/AAAAAAAACF0/PvBsiDxIGzU/s640/47.png" width="511" /></a></div>
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<a href="http://3.bp.blogspot.com/-yK03fQGmOSk/UdwaaQJuomI/AAAAAAAACGA/W_rjkZMpFko/s1600/48.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="266" src="http://3.bp.blogspot.com/-yK03fQGmOSk/UdwaaQJuomI/AAAAAAAACGA/W_rjkZMpFko/s640/48.png" width="511" /></a></div>
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<a href="http://3.bp.blogspot.com/-HGj430kK0_o/Udwaa32iqxI/AAAAAAAACGM/D0wr4pmb324/s1600/49.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="284" src="http://3.bp.blogspot.com/-HGj430kK0_o/Udwaa32iqxI/AAAAAAAACGM/D0wr4pmb324/s640/49.png" width="511" /></a></div>
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<a href="http://1.bp.blogspot.com/-qatUlr15u9s/UdwafPy2YlI/AAAAAAAACHI/ThKdTOiAUso/s1600/52.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="280" src="http://1.bp.blogspot.com/-qatUlr15u9s/UdwafPy2YlI/AAAAAAAACHI/ThKdTOiAUso/s640/52.png" width="511" /></a></div>
<br />Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-30540024188582050822013-07-05T13:16:00.002-03:002013-07-05T14:34:02.384-03:00Sobre detalhes e elipses<div style="text-align: right;">
"Nenhuma felicidade é definitiva.<br />
Talvez nenhuma memória o seja"</div>
<div>
<br />
<div style="text-align: justify;">
Fernando, terminei de ler seu livro há duas semanas e na impossibilidade de escrever uma crítica literária com todos os critérios bem delimitados, esboço essa carta como um desvio, pois se os livros são queridos e por isso escrevemos nossas críticas, livros de amigos são mais queridos e, acredite, só podem ser respondidos (anacronicamente?) com uma carta. Quando tomei <i><a href="https://www.facebook.com/umdetalheemh" target="_blank">Um Detalhe em H</a></i> em minhas mãos, de imediato bateu a vontade de escrever alguma coisa sobre ele<i>,</i> não qualquer coisa, e enquanto não conseguia responder a vontade com palavras, acumulava toda dificuldade de grafar a obra de um amigo, dificuldade acentuada pela doce introdução de Lourival. Por mais redundante que possa soar diante do título, você descortina página a página uma poética do detalhe, costurando conexões distintas entre a dimensão do instante e a dimensão da potência, muitas vezes engendrando, com secura ou afeto, a constituição e a transfiguração do que aprendemos a chamar de memória. Entendo o percurso de todos os autores que já contribuíram para essa jornada inesgotável em busca do passado, mas confesso que diante do detalhe, minha identificação foi espontânea: desde pequeno estimulei minha percepção cascavilhando e me encantando com o que não aparenta uma majestosa importância, com o que é deixado de lado, com o que também aprendemos a chamar de esquecimento. Talvez seja um fascínio. Os detalhes, Fernando, são como as folhas balançando no fundo de um filme dos irmãos Lumière, são como as folhas da querida árvore de Hugo, seu protagonista. Não sou capaz de mensurar a gama de experiência pessoal contida na obra, mas sinto uma intimidade no ar, não só pelo uso da primeira pessoa, mas particularmente pelo carinho contido em suas palavras no retorno à tenra infância. <i>Um Detalhe em H </i>parte de uma pergunta: "a partir de que detalhe, minha história mudou?" e definitivamente essa é a pergunta que mais fiz e continuo fazendo em minha vida. Não que não esteja ou estivesse tranquilo em meu caminho, apenas sou incapaz de deixar de fabular, é claro, pelo menos outros oito possíveis.</div>
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<br /></div>
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Não sei se a impressão vem da pré-leitura ou da pós-leitura, Fernando, mas sinto uma marca de Clarice em sua escrita, especialmente quando o livro assume nuances existencialistas, com Hugo assoberbado entre devaneios do cotidiano, assombrado pela ausência da mãe e pela ambivalência que conduz a relação com o pai e Helena. Ainda assim, a marca definitiva de <i>Um Detalhe em H, </i>para mim,<i> </i>é a intervenção na palavra de um firme olhar cinematográfico, a começar pela forma como você tensiona o campo da observação através de um protagonista que observa, mas consciente de ser um protagonista observado pelas coisas e pelo mundo, pela lagartixa, pela amiga árvore, pelos objetos da sala. Hugo é espectador e espetáculo. Além disso, as elipses que pontuam o ritmo da narrativa surgem como seu grande trunfo literário: em alguns momentos do livro, fui abatido pela sensação de estar subindo ou descendo as escadas e, de repente, deparar-me com um degrau numa altura ou largura diferente. Sabe como é aquele instante em suspenso que antecede a queda? Pois é, há inúmeros momentos em que você conseguiu me passar esse <i>instante em</i> <i>suspenso</i> por meio de suas temporalidade saltadas. As elipses são quase como cortes cinematográficos, vão selecionando instantes durante a incursão da infância até o fim da adolescência, movimento que me conquistou pelos próprios clichês que aprendi a cultivar e não me envergonhar: "a natural curiosidade pelo tamanho do mundo", o prazer de brincar sozinho, os pés balançando no sofá a trinta centímetros do chão, o prazer de observar e viver as situações por outros ângulos, os bichinhos de chuva bailando ao redor da lâmpada, o carinho rústico de nossos pais, o ímpeto de esconder o cadarço dentro do sapato por não saber amarrá-lo, as lembranças da biblioteca, a ereção constrangedora dentro do ônibus lotado. Incrível como <i>Um Detalhe em H </i>foi despertando sistematicamente memórias, como se as lembranças de Hugo se misturassem e semeassem às minhas próprias lembranças: do desmaio numa brincadeira de esconde-esconde, do frio na barriga ao ver meu pai chorando, assim como pela noite que encerra um medo ou a solidão que engrandece os espaços vazios. Seu livro me proporcionou o ato de ler como um ato de lembrar, portanto, agradeço a leitura e a rememoração.</div>
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<br /></div>
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É isso, forte abraço,</div>
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<br /></div>
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Rodrigo</div>
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Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-69066154426405387212013-06-30T17:30:00.000-03:002013-06-30T17:30:00.748-03:00Assunto de Família (Brasil, 2010), de Caru Alves<iframe allowfullscreen="" frameborder="0" height="289" mozallowfullscreen="" src="http://player.vimeo.com/video/35278450" webkitallowfullscreen="" width="510"></iframe> <br />
<a href="http://vimeo.com/35278450">Assunto de Família</a> from <a href="http://vimeo.com/alesamori">Ale Samori</a> on <a href="http://vimeo.com/">Vimeo</a>.Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-5629935138998380192013-06-27T19:47:00.000-03:002013-07-01T17:10:37.078-03:00Uns e outros<div style="text-align: justify;">
Depois de dois dias de protesto, Ricardo acordou meio naquela ressaca política, meio solitário e percebeu meio em dúvida que a coisa estava meio assim: "começou o protótipo de guerra civil, cada um que pegue sua faca e canivete e mate ~o outro~ por razões de diferença de classe, raça, sexualidade, região, bairrismo, marca da cueca, time de futebol, gênero musical, doença, traços indígenas, profissão, preferência partidária, idade, roupa feia, alergia, placa do carro, tamanho da catota, tipo de cabelo, gosto cinematográfico, religião, jeito de andar, forma de falar, beatles ou stones, olheiras, tamanho do pau, tamanho da mão, sonhos atrelados, escolaridade, horas de trabalho, peso, força da peruca, cor do olho, carne ou alface, orelhas grandes, estilo da barba, perfume, prazer, inveja, recalque, grelo gerando na alta, truffaut ou godard, famosidades, saber nadar, número do sapato, posição na cama, casacos de pele, nariz torto, antecedentes criminais, performance, casa ou prédio, nível alcóolico, cores prediletas, gosto artístico, frutas prediletas, animais prediletos, número, lugar, objeto e todas as outras possibilidades dementes a sua escolha". Ricardo teve certeza que uns nunca gostaram muito dos outros, apenas engoliram a raiva enquanto podiam. O tempo da tolerância tinha se esgotado.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-42913102922802219062013-06-21T08:14:00.000-03:002013-06-28T05:59:13.685-03:00Protestos?<div style="text-align: justify;">
Estou meio afastado de qualquer comentário nas ~redes sociais~, porque não consigo entender direito o que está acontecendo no país, imagino que muitos estejam atrapalhados em suas próprias dúvidas, mas seguramente desgosto da vibe coxinha nacionalista dos protestos (aliás, nem sei se a palavra certa é ~protesto~ no caso de Recife!) da mesma maneira que toda minha timeline desgosta em suas vertentes muy próximas, quase iguais, com diferenças irrisórias entre os argumentos dos amiguinhos x, y e z. Não sei se cancelei a assinatura de recebimento de posts das reacionárias e conservadoras (super possível!), mas o discurso está tão afinado na minha tela (o que é contraditório nas ruas!), que a ausência de um painel um pouco mais diverso me deixa com aquela pulga atrás da orelha; afinal cresci acostumado a escutar o que nem sempre gostaria e, principalmente, a falar o que nem sempre os outros desejariam. Tenho a impressão que a redundância da amizade e da bolha que montamos para que a diferença virtual se aproxime ficou evidente e tomou o limite quando descemos dos nossos prédios e fomos para a rua. Então, como todo mundo está falando mal do primeiro protesto daqui (talvez a expressão ~ato cívico~ resuma melhor o evento) e concordo com muito do que já foi dito, bateu a vontade de ser do contra e falar um pouco sobre o que gostei na tarde e noite de ontem. Ok, como um bom baderneiro de carteirinha, já saí de casa super receoso com vários posts cagando regras de protesto, dizendo tudo que podia e o que não podia, como agir, a cor da roupa para usar, sem violência, sem vandalismo, beba água, um discurso tão ~por demais patético~, que fiquei imaginando que a porra toda terminaria virando o resultado de uma cartilha ~se você estiver sem abadá de protesto, não entra no cordão de isolamento~. A questão é que foi ainda pior, porque, para minha tristeza, mesmo com 100 mil pessoas na rua (reforço: tinha mais de 100 mil ou o Galo da Madrugada não tem um milhão!), depois me dei conta que instalamos centenas de cordões de isolamento em nossas vidas; eles (os cordões) nos separam uns dos outros pela invisibilidade refinada; um contexto que não conseguia imaginar num primeiro instante. Somos desses indivíduos que cresceram em suas ilhas, taxaram o mar com divisórias e não querem visitar as ilhas dos outros.<br />
<br />
De qualquer maneira, vamos adiante na pretensão do texto. 1. Primeira coisa, a pauta seja sobre qual for a insatisfação (ou mesmo que sequer exista insatisfação clara!) está na mesa de jantar e na mesa do bar (e o melhor, as pessoas estão metendo o bedelho nas mesas dos outros e criando espaços de debate / conflito cara a cara, de tal modo que ônibus, metrôs, paradas e praças voltaram a abrigar ativamente alguma coletividade). É muito importante transformar o gesto, falar na cara, escutar na cara, jogar bolinha de papel na cara, não importa o tom, importa a convicção de que alguns absurdos e belezas afloram desse encontro. Sinto que nos criamos argumentando na tangente até quando um próximo pede uma opinião besta sobre o filme que fez ou precisamos reclamar de algum serviço mal realizado. Que me desculpem os enrustidos e tímidos, mas sinceridade e explosão são fundamentais. 2. Pela reclamação dos meus colegas, percebi o quão é difícil pra carai, pra carai, pra carai ter de compartilhar o mesmo espaço com tanta diferença na rua, com tanta coisa que você não concorda, acompanhei ~perfis de esquerda~ confessando o amor pelo sectarismo, confessando como se sentiam mal de estarem juntos naquele espaço que deveria ser só deles. A luta era também pela legitimidade do próprio movimento. Daí notei que é muito mais fácil viver numa cidade-cordão-de-isolamento em que as pessoas estão compartimentadas em seus apartamentos, carros, bolhas etc; o povo faz mil falas, filmes, festas e similares sobre essa cidade verticalizada, desumanizada, sem espaço público, alguns com um mega-hiper-ultra ressentimento idílico de um tempo que não volta mais (batendo nos mesmos acordes saudosos das marchinhas de carnaval!), mas é aquela coisa básica: mais fácil falar do som cafona da festa do vizinho, estando na sua sala de estar vendo seu filme cabeça ou série obscura do que estar ao lado desse mesmo vizinho na rua. Fico encucado me perguntando se na real, se na real mesmo, as pessoas querem essa cidade menos segmentada, porque desconfio que ontem, elas perceberam o quão difícil é escutar as merdas do vizinho no seu pé do ouvido e no repeat. E a quantidade de vizinhos é imensa, é quase como se os comentários de youtube estivessem ocupando as ruas e escolhendo a banda sonora. Remoendo o que sobrou de meus princípios, no entanto, desconfio que devemos aprender a conviver, a combater frontalmente e, pior, de repente, a deixar rolar tesão pelos reaças, quando for o caso.<br />
<br />
3. Brincando de ranking, se fosse eleger o momento mais bonito, elegeria os <a href="http://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2013/06/no-recife-manifestantes-abusam-da-criatividade-nos-cartazes-e-faixas.html" target="_blank">cartazes</a> reunidos nas grades da Praça da República e no Palácio da Justiça: já na volta para casa, todos foram encaixando nos ferros suas cartolinas, como amigos de um ente falecido deixam flores num cemitério, havia um silêncio estranho, puta melancólico, e dava para visualizar um ruído difuso, como um grande painel de vontades, alguns beirando ~toda irreverência do ativista pernambucano~. O meu Facebook não engloba / representa um centésimo das frases espontaneamente ali reunidas, afinal no meio da transformação coletiva do gesto, dos papéis enfiados em ferros pontudos, resplandecia uma centelha de revolução estética (rá!) influenciada pelo nosso ímpeto de Carnaval. Naturalmente, valeu mais que os km andados ouvindo as pessoas gritando ~hino nacional, hino de pernambuco, hino nacional, hino nacional, sou brasileiro, ah é pernambuco, hino nacional, hino nacional...~. Só fiquei pensando que o protesto sem-hino-nacional-como-grito-de-guerra estava mais legal, porque no meio da Conde da Boa Vista me peguei várias vezes procurando o controle remoto para colocar o mundo em mute. Assumo: simplesmente não aguentava mais ~aquele povo uó~. 4. A polícia passava tranks no meio da galera (aliás, a PM está precisando de um nutricionista urgente!), a polícia civil estava participando com cartazes (o que eu achei massa); depois teve a polícia cercando a Assembléia Legislativa, mas nem era tanto caminho dos presentes; a câmara dos vereadores super desprestigiada sem um policial sequer defendendo e ninguém se prestando a atacar; o choque com seu ~jeitinho~ fazendo pressão ~já passou da hora do protesto, podem voltar pra casa~ ao passar quase atropelando e buzinando para a galera perto da Praça 13 de maio, depois com uma caminhonete na contramão e, #momentosmemórias como usam por aí, geral abrindo com medo quando um grupo de malas rochedo passaram na Av. Guararapes com aquele tipão braço aberto, pés descalços, tatuagens verdes e cara de quem tira o couro de tudinho sem um pingo de dó. Desculpa, mas eu sinto um prazer irresistível com o medo estampado na cara da classe-média-sou-de-pernambuco-sou-de-casa-forte e foi foda ver os buracos se abrindo, os olhos arregalados e o pavor que resultava em correria fulminante. Quando já estava longe, vendo uma projeção "Passe Livre" dos meninos da Jacaré Produções num dos prédios da Av. Dantas Barreto, rolou uma vaia lá trás: desconfiei que era uma pura resposta ao contato direto entre diferenças e, para além de confirmar a idiotice, achei legítimo que uma classe usasse da vaia para ensurdecer o seu próprio medo.<br />
<br />
5. Durante incontáveis situações de bom-mocismo-vou-vomitar-aqui-agora, bateu aquela sensação de que estava fazendo massa para um metaprotesto, que as pessoas estavam ali porque acordaram meio putas, ok, só que o ímpeto era mais levado por conta desse ~clima de protesto que atravessa o país~, então ~vamos fazer o maior protesto e o mais pacífico e encher de beleza a nossa cidade~. Ouvi gritos e quase me ofereci como vítima voluntária para o cara que estava com um cartaz solicitando guilhotinas: ~puta que pariu, Recife fez o maior protesto do Brasil~ ou ~puta que pariu, Recife mostrando a paz para o resto do Brasil~. Aliás, nem vou perder tempo defendendo minha postura, sou totalmente da ala radical, só digo que esse papo do pacifismo inerte é um saco, nunca perdoei a pessoa que inventou a premissa de que ~partiu pra briga física perdeu a razão~, sinto que precisamos entender outros conceitos e nuances da palavra violência nas relações de poder. Talvez assim consigamos quebrar um pouco o conformismo, despedaçar a obrigatoriedade de um ~protesto ordeiro~ (afirmo: oscar de expressão mais cretina do ano!) e notar que em situações minimamente mais subversivas, a resposta governamental costuma ser outra. Ainda assim, curti quando alguém subiu no teto da parada de ônibus peba e geral gritou "sem vandalismo", porque vozes dispersas em pontos aleatórios, juntas à minha voz histérica, foram ganhando corpo com o grito "sem moralismo". Novamente, a cara de choque da família pernambucana, a mesma que aprendeu a protestar assistindo o Jornal Nacional, valeu o grito. Nunca perceberão que aquela parada é o próprio vandalismo. 6. Outro ponto melancólico que adorei foi a chegada no Marco Zero e a pergunta compartilhada "E agora?", senti uma grande sombra de Dudu sobrevoando toda cidade rindo pela bela orquestração, afinal, a cidade estava toda prontinha para aquele protesto meia-boca e para que ele fosse quase uma marcha pela paz de visibilidade internacional. Material de campanha, check. A ficha caiu na cabeça das pessoas ali (fico imaginando aqueles playtimes com defeito!) e foi bonito ver uns olhando para os outros sem entender, sem saber o que fazer e depois, quando grupos dispersos saíram caminhando para ruas transversais, quase que aleatoriamente, não sei se as próprias pessoas perceberam, mas estavam sentindo-se mais seguras que o normal em pontos no centro da cidade. Meio burguesa essa afirmação, mas um estava fazendo a segurança do outro sem precisar fazer coisa alguma, apenas estando à paisana atravessando os becos sujos e escuros.<br />
<br />
7. Cheguei em casa, entrei no Facebook e me entupi de paranóias fast food: primeiro horrorizado com a perseguição dos coxinhas aos militantes com bandeiras e camisas de partidos em Recife, até vi uma sequência de fotografias com coxinhas dando voadoras Bruce Lee num pessoal do PC do B (entendo que partidos podem cooptar movimentos sociais instrumentalmente, mas, sejamos sensatos, no caso dessa resposta antipartidária da ~revolta dos coxinhas~, o caso era BEM diferente!); segundo, li vários relatos do Bope tocando o terror no Rio de Janeiro, caveirão na rua, bairros fechados, vários militantes presos e escorraçados; terceiro veio com amigos anunciando o golpe, contabilizando pessoas desaparecidas, uma atmosfera cada vez mais confusa e, por fim, terminei um bocado obcecado com a tal rebelião ameaçada por Feliciano caso o projeto de Cura Gay recebesse interferência do legislativo ou fosse barrado nas próximas instâncias. Quando dei por mim estava entrando na esquizofrenia de um levante evangélico-militar que obrigaria o fim dos partidos políticos, tanques seguindo para a rua atirando em alvos estratégicos (boates, igrejas católicas, terreiros e saunas!), bichas, babalorixás e beatas sendo encaminhadas para tratamento psicológico compulsivo (xangô christian gays party!) e, aí sim, tive certeza do meu papel como guerrilheiro (the raspberry reich!), pensei na minha viagem para o Chile como exílio político, sei lá, assumi de forma distorcida a história dos meus pais, enquanto permanecia deitado com o balão sobre a cabeça: ~se essa porra não entrar numa guerra civil depois disso, (sim, por motivos religiosos!), puta que pariu~. Acordei tranquilo, com um tico de vergonha, tomei café rindo de mim mesmo, refletindo toda a validez de experimentar uma apreensão daquela natureza, uma coisa de amplitude nacional que jamais passou pelos meus infâmes receios. Talvez nunca aconteça novamente. Tá bom, ~cansei!~ de listar tantas coisinhas, dei início a esse texto ontem à noite, meio bêbado, meio morrendo de dor cabeça, meio de esquerda, porque terminei bebendo num bar simpático no final das contas, cheio de encontros com pessoas que não existem nos cordões de isolamento que costumo frequentar, com direito a cerveja litrão por R$5,50 (yeah!), uma mesa do MST com homens fortes numa conversa super politizada, bichas comportadas e bichas travestys histéricas dançando gaydrilha e sequestrando os homens que passavam pela rua para o ~balancê~, e uma junção sonora do Pink Floyd que tocava dentro com um brega que tocava fora. Sei que a maioria dos presentes na passeata (fico receoso de usar manifestantes e protesto, confesso!) e muitos dos meus amigos, jamais botariam o pé por lá. Azar o deles. O caldinho estava ótimo.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-47831871229258710822013-06-06T19:05:00.001-03:002013-06-06T19:05:20.763-03:00Jornalismoou o dia em que a franquia chegou ao fim.Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-16628291662842075342013-05-31T15:27:00.000-03:002013-07-15T15:43:08.498-03:00Poema de siAo lado da pimenta e do conhaque,<br />
brasas, marchas, vacas, avalovara,<br />
montanhas congeladas pelo chá de alcaçuz.<br />
<br />
Ian deitou no meu peito,<br />
quente, colado, nevado<br />
e pediu um breve poema de si.<br />
<br />
Então, escreveu no papel:<br />
"seja coerente"<br />
e eu prontamente respondi:<br />
"não seja"!<br />
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Zefini.Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-80261117116838489372013-05-29T15:47:00.000-03:002013-05-30T01:30:45.391-03:00A Primeira Noite de Tranquilidade (Itália, 1972), de Valerio Zurlini<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-pWT9_tjEgGs/UaYfAf8wFqI/AAAAAAAAB-E/hxCn5yxYxkA/s1600/vlcsnap-2013-04-30-13h02m39s17.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="281" src="http://4.bp.blogspot.com/-pWT9_tjEgGs/UaYfAf8wFqI/AAAAAAAAB-E/hxCn5yxYxkA/s640/vlcsnap-2013-04-30-13h02m39s17.png" width="511" /></a></div>
(Publicado originalmente no <a href="http://www.filmologia.com.br/?page_id=6838" target="_blank">Filmologia</a>)<br />
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Ao longo de irremediáveis visitas cinematográficas, mantive certa desconfiança desses filmes, cuja estrutura narrativa é absolutamente costurada – ou submetida – por uma espécie de soberania do acaso, fazendo com que o roteiro seja arquitetado através de uma estrutura de coincidências, um malabarismo - por vezes patético - de acontecimentos conectados: são os futuros casais que trombaram dez vezes antes de se conhecerem ou os desconhecidos que as situações e o tempo insistem em postular como inimigos. Alguns espectadores ainda ficam ansiosos, torcem os dedos para uma olhadela à esquerda, um acidente de trem, a desistência de um voo. Seguramente esse não é o caso de <i>A Primeira Noite de Tranquilidade</i>, produção em que Valerio Zurlini intensifica sua postura existencialista, por meio de um homem que, mesmo afundado na melancolia e numa angústia dilacerante, continua enfrentando o mundo, escolhendo cidades apenas porque ainda não as conhece, certo de que acaso e destino são conceitos que se levados ao paroxismo se tornam indiferentes. O cineasta italiano retorna a cidade de Rimini, um lugar entre os lugares, e diferente da estação de <i>Verão Violento</i>, recorre ao inverno como metáfora contextual para embalar a íntima condição de um homem entregue ao tédio, homem que adentra a neblina ao som rasgante de um trompete, descobrindo nas ruínas de uma casa a poética de um passado renegado, mas não completamente ausente. Trata-se, em parte, do professor de literatura interpretado por um Alain Delon mais velho, mortificado, assim como, em parte, trata-se do próprio Zurlini no fim de uma carreira pouco reconhecida, supostamente sem infâmias ou louvores, cujas caminhadas pelas brumas, num ímpeto sem sentido das coisas, são contornadas por um efeito exasperante de finitude. </div>
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Na história de amor – ou apenas de estímulo do tesão como processo antidepressivo – entre um professor e sua aluna, dois animais feridos, Zurlini descarta a problemática do tabu do relacionamento, por um jogo de poder e sedução, sem clareza de qual lado é o mais forte. O cineasta definitivamente evita o clichê ~ele mais velho, ela mais nova~; ~ele professor, ela aluna~, aliás, um dos grandes clichês no cinema e na literatura, sem dúvida. Descarta também uma discussão política evidente ou panfletária – e talvez por isso, o filme seja mais instigante – ao revelar um protagonista supostamente apolítico, desinteressado, farrista, sonolento, mais preocupado com o debate sobre o belo em versos de Petrarca. Na falta de vontade de tecer argumentos mais específicos, coloca até grosseiramente socialistas e fascistas no mesmo saco, sem distinções. Assim sendo, como um grande tratado sobre a conjunção de três palavras guarda-chuvas – vivência, sobrevivência e existência –, o filme não desemboca num tedioso discurso filosófico, pois apesar de recuperar autores conhecidos, Camus e Sartre, toma o melodrama, aqui sem grandiloquência ou crises de choro, como seu verdadeiro desenho de expressão. Daí frases impiedosas como “não foi sua beleza que me atraiu, mas o desconforto que tem dentro de si, sua melancolia sem fim, não posso suportá-la” convivem em harmonia com uma trilha sonora típica do gênero, cafona e exagerada, por vezes histérica, ao emular as emoções dos personagens para uma melhor apreensão afetiva dos espectadores. Ainda assim, a estratégia de Zurlini dissocia sua diegese da projeção clássica do público, afinal, por mais imobilizados pela tristeza, seus personagens não se rendem às lágrimas, não por um torpor de insensibilidade, mas para não abrirem qualquer prerrogativa de redenção completa ou libertação do corpo. A impressão de morte está sempre à espreita.</div>
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Dominici, o professor, surge na escola sem qualquer projeto pedagógico, sua postura sublinha mais uma opção na falta de opção, a certeza de que ainda precisa decidir mesmo aportado na desistência. No primeiro dia de aula insinua seu espaço para os alunos dizendo que não quer obrigar nada a ninguém, quase consciente da impossibilidade de ensinar, negando seu papel como “mestre que, ao mesmo tempo, aparece como paradigma filosófico e como agente prático da entrada do povo na sociedade e na ordem governamental modernas”. Como o mestre ignorante do filósofo francês Jacques Rancière, Zurlini parece estar atento ao debate que coloca em dúvida o ato de receber a palavra do tutor – a palavra do outro inundado de sabedoria – incitando um caminho entre o testemunho de igualdade e o gesto acentuado de distância. Só que o movimento do personagem de Delon é destituído de desejo, ele apenas está ali, sem intenções ou projetos a médio ou longo prazo. Diante do garoto revolucionário de desempenho exemplar, inteligente, raivoso, que provavelmente abandonará sua militância política pelo conforto econômico, e da garota de beleza submetida à angústia, arisca, felina, que provavelmente desistirá da escola para se dedicar a um casamento malfadado com um homem rico, o professor insiste na liberdade como um problema, ajustando a falta de liberdade como plataforma para a promoção dos momentos de alegria. A felicidade não pode ser um estado, apenas um estágio. Aliás, o filme condensa muito bem a forma paradoxal como as pessoas, no espaço externo ao do colégio, usam o vocativo <i>professor</i> durante uma discussão sobre assuntos relevantes ou irrelevantes: há ali – e confesso que já passei pela situação – uma estranha mistura de menosprezo e respeito. </div>
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Zurlini desenha personagens encarcerados na condição apontada durante a visita de Dominici e Vanina a um parque aquático: enquanto ela carrega um lamento pelos golfinhos presos em tanques, ele relata que “se forem soltos no mar, vão sentir falta da piscina, do conforto, do almoço, do café da manhã fácil”. A situação lembra sem esforço, inclusive, o final de <i>A Mulher das Dunas</i>, quando finalmente o rapaz consegue fugir da clausura, encontra o mar depois de viver no deserto quase sem contato com a água, mas decide voltar para o cativeiro, fascinado pelo balde em que depois de muito esforço conseguiu reter alguma quantidade do líquido. <i>A Primeira Noite de Tranquilidade</i>, expressão usada pelo protagonista para descrever a morte, uma noite sem sonhos, sem remissões ao passado e suas fantasmagorias, revela o ato de viver sua vida como o ato de suportar sua vida. A narrativa se esgueira desde o princípio como uma tragédia. Não temos um herói necessariamente deprimido, mas um tanto indiferente em relação ao mundo e em essência a si mesmo, sempre com seu cigarro na boca, passando pouco tempo em seu apartamento pequeno, decidido a ficar longe de sua mulher adúltera e suicida, de quem não conseguiu se separar por conta da posição permanente de quem sente falta de vontade por todas as coisas. A proximidade da angústia sem ser angústia, o corpo desgastado de Alain Delon, olheiras e ausência infindável nos olhos, se inscreve na ideia de que “a validade de um sentimento não existe, a validade de uma ilusão não existe, não há idealismo que se sustente, não há nada que esteja fora da amarga sobrevivência”, como definiu o próprio cineasta numa entrevista. </div>
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Além das sequências de passeios de Dominici, seja com Vanina para conhecer uma pintura renascentista, com o professor fazendo uma leitura inspirada por Barthes, seja com o amigo Spider para incutir um passado que se anuncia em tons bíblicos, o grande momento do filme está na alternância campo contracampo da cena da boate, uma alternância fatalista de uma desilusão árida. O cinema de Zurlini se funda como o cinema do olhar oblíquo e da troca de olhares presentes. A sequência resplandece em outros momentos da carreira do cineasta, como em <i>Quando o amor é Mentira</i> e até mesmo em <i>Mulheres no Front</i>, mas o que mais impressiona na dança de Vanina sob as luzes da pista enquanto encara o professor por cima dos ombros do futuro marido, é também o jogo de intensificação e regressão do olhar, a primeira instância sempre sob a luz vermelha e rápida, a segunda sob todas as outras cores um pouco mais lentas. Se <i>A Primeira Noite de Tranquilidade</i> é naturalmente um filme associado ao fator geográfico, de um inverno numa região costeira melancólica povoada pelo rancor, pela dissimulação e pela violência, termina sendo mais ainda, como definiu Zurlini, “a história de um homem que tem sempre uma relação de morte com os outros e que encontra a juventude, mas justamente uma juventude que esconde, na realidade, a morte. É como um romance popular velho, tal qual o mundo”. Irrompendo quase de maneira irônica, o final projeta uma possibilidade de mudança, do personagem encontrar o desejo, criar interesse no mundo, mas traz a morte como elemento desonesto, que no meio da falta de sentido, obedece à, até então negada, soberania do acaso. Os créditos surgem sobre a inexistência de pontos de fuga.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-63958922641330042852013-05-28T18:44:00.000-03:002013-05-29T08:23:58.540-03:00Mulheres no Front (Itália, 1965), de Valerio Zurlini<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-yCWobFbp2K8/UaUhnz2FGlI/AAAAAAAAB90/6yEYCaaEu6c/s1600/vlcsnap-2013-04-27-23h33m43s240.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="290" src="http://2.bp.blogspot.com/-yCWobFbp2K8/UaUhnz2FGlI/AAAAAAAAB90/6yEYCaaEu6c/s640/vlcsnap-2013-04-27-23h33m43s240.png" width="511" /></a></div>
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(Publicado originalmente no <a href="http://www.filmologia.com.br/?page_id=6832" target="_blank">Filmologia</a>)</div>
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Vou me dar ao direito de desenvolver esse ensaio com uma longa digressão: não lembro exatamente quando começou minha curiosidade pelas guerras, talvez quando encontrei, ainda pequeno, cascavilhando na biblioteca do meu pai, um imenso livro de fotografias que se pretendia uma história ilustrada da Segunda Guerra Mundial. Hoje, folheando a publicação editada por Charles Herridge, notei como minha atração inusitada recaía sobre os líderes embriagados em sua própria compostura; paisagens assoladas, prédios incendiados, ruas ocupadas; armamentos, aeronaves, embarcações; uma mistura de austeridade, tecnologia e ruína. Sentia-me, também, enfaticamente seduzido pelas expressões humanas anônimas do conflito, soldados ora cabisbaixos, ora festivos, ora mutilados; prisioneiros famintos, refugiados arrasados; mulheres assustadas, grávidas, com crianças desnutridas no colo. Seguramente posso afirmar que esse conjunto documental ao registrar as demandas das inúmeras batalhas e do desastre humano, conseguiu materializar no meu imaginário a experiência, o clima, a atmosfera do que significava um evento histórico e imprimir em definitivo o semblante de seus personagens centrais. Nunca vou esquecer das terríveis supostas fotos da morte de Mussolini. A partir desse contato primeiro, o interesse pelo acontecimento <i>guerra</i> só cresceu, parte de minha reclusão na pré-adolescência foi dedicada ao estudo - na Barsa - da história da humanidade pela perspectiva de fatos similares – Guerra do Peloponeso, Guerras Púnicas, Guerra dos Cem Anos etc – mantendo uma atenção especial para o ponto de partida e mais devastador acontecimento militar do século XX. Aliás, ainda sinto uma imensa atração pelo tema, dia desses comprei uma enciclopédia com doze livros da evolução de veículos militares através dos conflitos e não consigo me desvencilhar da empáfia que me suga quando fico sabendo de algum confronto novo no quinto dos infernos. Confesso que até mesmo quando escolhi jornalismo, graduação que nos primeiros semestres cursei ao lado de relações internacionais, pretendia seguir carreira profissional como correspondente em áreas de conflito, estranhamente inspirado por outro corpo de imagens, vistas durante a infância pela televisão, em meados da década de 1990.<br />
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Se não tenho lembranças da Guerra do Golfo por uma questão de idade e depois o conflito me entediava porque as imagens lembravam os jogos mais básicos do <i>Atari</i>, tudo era muito distante e seguro; a Guerra da Bósnia perpetuou imagens na minha memória, pois havia uma imersão ampliada, as câmeras estavam no meio das batalhas, as balas zuniam captadas pelos microfones, pessoas eram baleadas dentro dos planos, jornalistas em passagens ao vivo precisavam lutar por suas vidas, prédios eram quase aleatoriamente atingidos por mísseis. Havia todo um agenciamento da morte transmitida para o planeta inteiro, situação já insinuada pelas fotografias da Segunda Guerra, especialmente numa fotomontagem propagadística de Hitler sorrindo num campo de milhares de russos mortos ou numa captação aérea em Hiroshima após a bomba, mas nada com tanto realismo e proximidade das imagens coloridas da TV. Por algum motivo que só a terapia um dia poderá responder, com oito ou nove anos, mal entendia aquela complexa correria, mas sentia um desejo de acompanhar tudo ainda mais de perto: só sabia vagamente que o desmembramento da antiga Iugoslávia tinha transformado em inimigos, da noite para o dia, antigos vizinhos, literalmente vizinhos de rua que haviam compartilhado a mesma vizinhança por décadas, mas que tinham sido inflados por suas origens étnicas e religiosas diferentes. Recentemente, lendo <i>Uma História de Sarajevo </i>e <i>Gorazde, </i>dois livros do jornalista em quadrinhos Joe Sacco, consegui formalizar o impacto da aproximação precoce diante de uma ansiedade compulsiva dos profissionais de comunicação pela tragédia, não os via como urubus em busca da carniça ou vítimas do forçado ímpeto investigativo empresarial, mas como agentes que, naquela situação, soltos num campo em chamas, não podiam se manter neutros para sempre, pois o flerte com o perigo os obrigava a escolher e lutar por um dos lados. Se as imagens do livro, por mais fortes que fossem, representavam para mim uma ideia de <i>imagens históricas</i>, portanto, grandes, imutáveis, definitivas e distantes da minha realidade na minha vila na minha Várzea; as imagens vindas dos Balcãs surgiam num regime ontológico distinto, como se fossem <i>imagens privadas</i>, não necessariamente históricas, despertando meu interesse não pela <i>história da guerra, mas pelas histórias ocorridas durante a guerra</i>.<br />
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Antes que o tédio arrebate com sua descortesia alguns leitores, atento que a longa digressão-introdução se justifica, pois essas lembranças nunca tinham me ocorrido com tanta intensidade assistindo um filme de guerra como diante de <i>Mulheres no Front</i>, mesmo já tendo intimidade com a maioria deles, inclusive escrito sobre inúmeros. Foi como um passado desobediente, inebriado de fugas, reerguido diante dos olhos. Não obstante, antes de prosseguir, há, ainda, uma terceira e última lembrança para finalizar esse panorama pessoal, para além das imagens históricas da Segunda Guerra Mundial e das imagens privadas televisivas da Guerra da Bósnia. No final da minha infância, minha mãe, aproveitando o ensejo de meu interesse primordial pelo tema, começou a contar <i>histórias de filmes de guerra como histórias de guerra</i>, depois de algum tempo viria a descobrir que se tratavam de produções americanas sobre o Vietnam e produções italianas, mais ou menos distorcidas em suas linhas gerais. Havia naqueles contos da noite a junção das duas dimensões apreendidas inicialmente de maneira distinta e metodicamente disjuntiva, a dimensão privada estava dentro da dimensão histórica e vice-versa, as lágrimas pelos amigos perdidos escorriam depois do Dia D, a insônia pelas bombas noturnas acometiam durante a destruição de Dresden. Quase em todos os casos, suas versões ressaltavam a situação das mulheres nos conflitos, sempre descritas como figuras cientes de que não podiam confiar em ninguém e passíveis dos mais terríveis abusos. Ela costumava dizer - evocando vietnamitas estupradas, italianas estupradas - que "na guerra, a mulher está em guerra contra todos os exércitos". Não posso afirmar se algum dia, minha mãe chegou a comentar exatamente o filme de Valerio Zurlini em questão, tenho a suspeita que sim, mas lembro bem dela rememorando <i>Duas Mulheres</i> (Itália, 1960), de Vittorio De Sica, película que ilustra bem o sentido da frase materna. Acredito que através dessas três experiências, descritas aqui de forma quase didática, apreendi a intenção destacada no depoimento de Zurlini: “lendo os clássicos entendi quanto é bela a fusão entre uma vida privada e os acontecimentos históricos. A minha profunda formação tolstoiana se revela igualmente nesta pequena equação: uma história privada é engrandecida, e se torna extraordinária, isto é, necessária, se tiver como fundo um grande acontecimento histórico”.<br />
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Ambientado durante a conquista da Grécia pela Itália com apoio da Alemanha nazista, uma nova intervenção militar que retoma vínculos coercitivos entre duas nações de ligação cultural milenar, <i>Mulheres no Front</i> começa com corpos estendidos no chão, numa época em que responder honestamente perguntas - como uma vez se referiu Dilma à Ditadura Militar - era perigoso. O filme distribui ao longo dos atos um amplo contexto para acompanhar a jornada de doze prostitutas, conduzidas por três tenentes de intenções paradoxais – um melancólico, um bobo violento e um fanfarrão materialista – no intuito de deixá-las em bordeis para satisfazer soldados italianos em batalha. A metáfora do calvário é até bastante óbvia, contudo, o filme consegue instaurar um complexo cenário do limite como situação cotidiana, não só pela paisagem física, dos espaços destruídos, inseguros, abandonados, mas pela paisagem violentada dos rostos: no cinema de Zurlini, a marca de um trauma pessoal se transforma na marca da história. Durante uma das primeiras cenas, na apresentação das figuras femininas, um dos momentos antológicos da filmografia do cineasta, um travelling atravessa um vasto salão, capturando as mulheres e seus olhares lascivos, sombrios, sonhadores, de maneira frontal em posturas e pontos distintos do quadro. O painel expressivo da sequência é desorientador. À primeira vista, podemos achar que se trata de mais um filme tardio neo-realista, a prostituta novamente como modelo de heroína, numa história passada durante a guerra. Todavia, se o movimento cinematográfico tinha nas suas origens, a vontade de mostrar que os italianos não cometerem tantas atrocidades, revelando as lutas de resistência contra Mussolini no interior do país ou os impactos póstumos do conflito na sociedade, Zurlini inverte a situação, revela os <i>Camisas Negras, </i>adentrando justamente no labirinto que fora deixada de lado, que fora apagada da memória cinematográfica de seus conterrâneos. Mais que isso: <i>Mulheres no Front</i> traça uma incursão pela desesperança das prostitutas e seus condutores, conta não a história da guerra, mas a história da intimidade na guerra, dos anos perdidos na guerra, das necessidades e sonhos na guerra, amplificando o microcosmo por meio da melancolia dos contatos mínimos e dos gestos aparentemente distraídos.<br />
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Acontece que num mundo dominado pelos homens, a guerra só pode ser pensada como o universo da estratégia, do domínio, estimulando o cineasta a se dedicar à figura das mulheres, presas ao universo da tática, que, para Michel de Certeau, significava a arte do fraco que utiliza, manipula e altera os mecanismos de dominação, subvertendo-os. A tática diferentemente da estratégia não é capaz de cavar trincheiras em todas as esferas de poder, não é capaz de lutar de igual para igual, afinal sua especificidade é a de exercer pequenas fraturas, muitas das quais desordenadas, funcionando quase como uma “arte dos golpes, dos lances, um prazer em alterar as regras do espaço opressor”. No filme, essa situação permeia toda narrativa como uma forma de sobrevivência: quando um grupo de homens bêbados ameaça invadir a força o lugar em que as mulheres estão passando a noite, uma delas, toma a frente da porta e avisa: “uma de nós tem sífilis, mas não vou dizer qual”. Todos terminam desistindo. Não se trata de um discurso machista sobre a fragilidade ou uma defesa feminista, <i>Mulheres no Front</i> trata mais da resistência sem atravessamentos ideológicos claros, vai costurando um embate entre os dramas pessoais, desses que jamais entrariam nos livros convencionais de história, focando na relação entre o tenente melancólico e a prostituta mais arisca. O filme funciona como os trens na guerra, como uma derradeira noite de amor, alimentado por elementos e ímpetos de despedida, conjurando um sentimento tenro que vai se degradando. A cena final, provavelmente a mais bela de todos os filmes de Zurlini, mostra os dois recém amantes em sua primeira e última noite de amor, ela então solta uma longa sequência de palavras, desconsiderando qualquer possibilidade de se verem novamente, de terminarem como nos finais felizes tão comuns: “mas nós dois, estamos aqui, temos a mesma idade, mas não a coragem de olharmos nos olhos. Fomos humilhados. Falamos como duas pessoas velhas e em poucas horas teremos de nos despedir. Quando tudo tiver acabado, quem nos restituirá todos estes anos? Poderá ser esquecido? Eu te amo, mas falando isso nessas condições é como se estivesse orando por um filho nosso que tenha sido morto”. Na sequência, seguem caminhos distintos. Ela não olha para trás.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-74840124062813494802013-05-24T11:00:00.001-03:002013-05-24T11:03:39.995-03:00Coração de Bandido<div style="text-align: justify;">
"<i>Bateu a estranha quando entregaram o café de nós. Eles ficaram olhando para mim com um jeito estranho. Eu levantei, ele levantou também e estarrou para o meu lado. Eu estarrei para o lado dele também, daí veio o outro por trás e deu um negócio na minha cabeça. Aí eu fiquei no domínio deles, eles me amarrou, amarrou o meu pé, meu pescoço e eu não tive mais domínio de mim. Aí eles fez o que fez e eu desmaiei porque o lençol tava apertando. Já tirei cadeia com Michael em Paratibe, tive rixa com ele de lá. </i><i>O cara não entende não</i><i>, é maldade mesmo, coração de bandido é debaixo do pé, irmão, é debaixo do pé</i>".<br />
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Depoimento do rapaz estuprado por seus dois companheiros de cela na Funase do Cabo de Santo Agostinho.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-29018240947612914882013-05-22T07:54:00.002-03:002013-05-22T13:40:45.112-03:00Drinks<div style="text-align: justify;">
Daí o bairrismo senil recifense metido a cosmopolita decidiu <a href="http://produtos.ne10.uol.com.br/uisquecomaguadecoco/" target="_blank">nomear</a> um drink ~típico~ da região, whisky com água de coco, por meio de um ~concurso cultural~ com sugestões dos internautas. Passadas algumas semanas, os organizadores chegaram, então, aos trinta nomes mais votados, dos quais vão sair cinco finalistas e, depois, o ~grande~ vencedor. A lista, atualmente em votação, inclui referências e expressões como 'casa grande e senzala', 'frevo maluco', 'leão do norte', 'on the frevo', 'sabor da veneza' e tantas outras pérolas. Desde o exato minuto que coloquei os olhos nessa iniciativa, difícil chamar de ~concurso cultural~, fico só imaginando uma mesma cena de diferentes maneiras: uma pessoa de terno num casamento, numa formatura ou num bar, chamando o garçom de longe e pedindo ao vê-lo se aproximar: "amigo, você traz um casa grande e senzala, por favor". Sempre me surpreendo como a minha cidade consegue renovar sistematicamente seu status de metacidade.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-57161625634295230922013-05-14T22:06:00.000-03:002013-05-24T14:10:30.493-03:00desconsolo do gatoOlhando de lado,<br />
como bicho aninhado,<br />
salto e abrevio.<br />
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À espreita, cismado,<br />
como num pulo arriscado,<br />
corro e arrepio.<br />
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Durmo antes da hora.Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-11030878408668546592013-04-26T06:00:00.002-03:002013-04-26T06:00:45.480-03:00Longa Vida ao Cinema Cearense (Brasil, 2008), dos Irmãos Pretti<iframe allowfullscreen="" frameborder="0" height="288" mozallowfullscreen="" src="http://player.vimeo.com/video/44767898?title=0&byline=0&portrait=0&color=c2c2c2" webkitallowfullscreen="" width="510"></iframe> <br />
<a href="http://vimeo.com/44767898">Longa Vida Ao Cinema Cearense (Long Live Cearense Cinema)</a> from <a href="http://vimeo.com/user7395327">Alumbramento Filmes</a> on <a href="http://vimeo.com/">Vimeo</a>.Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-41693080034943932092013-04-20T11:40:00.000-03:002013-04-20T11:40:38.301-03:00Pudor<div style="text-align: justify;">
<i>"Em meio às nossas frágeis emoções, nada se assemelha tanto ao amor como a jovem paixão de um artista dando início ao delicioso suplício do seu destino de glória e infortúnio, paixão repleta de audácia e timidez, de crenças vagas e desânimos inevitáveis. Àquele que, com pouco dinheiro, adolescente talentoso, não palpitou vivamente ao apresentar-se perante um mestre, sempre irá faltar uma corda no coração, não sei que toque de pincel, um sentimento na obra, uma certa expressão de poesia. Se alguns fanfarrões cheios de si acreditam demasiado cedo no futuro, só para os tolos passam por gente de espírito. Nesse sentido, o jovem desconhecido parecia ter um mérito genuíno, se é que talento deve ser medido por essa timidez primeira, por esse pudor indefinível que as pessoas fadadas à glória sabem ir perdendo no exercício de sua arte, assim como as belas mulheres perdem o seu no jogo da sedução. O hábito do sucesso enfraquece a dúvida, e o pudor é, quem sabe, uma dúvida".</i></div>
<div style="text-align: justify;">
<i><br /></i></div>
<div style="text-align: right;">
Balzac em <i>A obra-prima ignorada</i></div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-71384433425029843322013-04-09T04:47:00.000-03:002013-04-26T12:31:03.128-03:00Jatobá<div style="text-align: justify;">
Passeando sem rumo entre os jazigos da internet, deparei-me com uma história, digamos, ~curiosa~: no exato ano em que nasci, 1985, acho que não no exato mês, parece que foi um mês depois, maio, a ilha do bairro do Recife quase desapareceu do mapa da região metropolitana, por conta de uma iminente explosão que destruiria aproximadamente o perímetro de 5km² a partir da costa. A situação era a seguinte: três navios estavam atracados bem próximos, juntos carregavam cerca de 5 mil toneladas de gás butano, o gás de cozinha comum - sempre pirei nas pesagens dessas coisas invisíveis - mas o que interessa é que um deles, o navio-petroleiro Jatobá, começou a pegar fogo. Bastante próximo, havia ainda o Parque de Trancagem do Brum, com nada menos que 150m³ de materiais inflamáveis, fazendo com que os bairros de São José e Santo Antônio também entrassem na lista de espaços parcialmente ameaçados. Era madrugada, o então governador Roberto Magalhães estava no décimo oitavo sono, foi acordado, não costumava abrir os olhos de bom humor, mas ao entender a gravidade da situação mandou evacuar a ilha inteira e foi tomar um café reforçado para curar o whisky da noite anterior. "Era puta e marinheiro fugindo enquanto os bombeiros chegavam", relataram as testemunhas ocultas aos radialistas. Todo o contigente da cidade fora deslocado para o local. Contudo, como já passavam das duas horas da manhã, a evacuação se mostrou um ingrato ofício, exceto pelos profissionais e amantes da noite, a população em peso estava dormindo ou desmaiada no limbo pré-ressaca, de modo que a única saída possível era uma operação aparentemente suicida, que rebocasse o navio-petroleiro Jatobá em chamas para uma distância segura em alto-mar. Obviamente não surgiram muitos candidatos, mas um não tão jovem rapaz, aliás, também não tão atlético, não com tantos cabelos e já um velho lobo do mar, Nelcy da Silva Campos, se ofereceu como voluntário para liderar a missão. Enquanto alguns bêbados sem medo da morte se amontoavam no Marco Zero para ver os fogos de artifício, ele seguiu em direção ao incêndio num pequeno barco de reboque, precisou serrar as cordas que prendiam o navio-bomba-relógio sob uma temperatura insuportável e, então, presos os ferros, arrastou o Jatobá para quatro mil milhas náuticas da costa. Ciente da importância histórica do momento e da carência do povo brasileiro por heróis contemporâneos, Nelcy retornou ao porto na proa do navio, peito estufado, barriga seca, falta de ar, pernas e braços sincronizados numa posição cuidadosamente galante. Registrado por todos os jornais, a cidade acordava com mais um nome que se transformaria em busto, enquanto a aeronáutica havia sido acionada para bombardear o navio em chamas e terminar todo o evento em grande estilo. Não foi necessário, porém: como quase toda história recifense, essa também terminou com um sentimento de heroísmo frustrado, pois lá no alto-mar, o incêndio extinguiu-se sozinho. Bêbados, putas, marinheiros, maconheiros e donas de casa acordadas no meio da noite, pegas com suas calçolas na mão, foram os primeiros a reclamar. Fico só imaginando como os donos da Moura Dubeux não gostariam de ter uma máquina do tempo, enviarem seus capangas para esse dia específico, na tentativa de impedirem, tal qual nos filmes, a ação de Nelcy. Com tudo destruído, sem um vislumbre nas ruínas, porque o abandono atual ainda cabe um vislumbre, certamente seria mais fácil e rápido aprovar projetos disparatados. Ou, quem sabe, o incêndio poderia apenas se extinguir.</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-14312493138642025912013-04-03T20:25:00.001-03:002013-04-03T20:49:00.235-03:00#cortedecabelo<div style="text-align: justify;">
Buscando um cabeleireiro barato e que me despertasse alguma simpatia, segui para a algazarra central de Casa Amarela disposto a não pagar mais que R$ 20 cravados, enquanto concluía que viver uma pindaíba financeira pesada, de tudo estar bem contadinho, de abandonar os luxo menos superficiais, era uma situação que alterava em definitivo a minha disposição, percepção e atenção diante dos bens e serviços oferecidos pelo mundo. Na impossibilidade de simplesmente optar pelo mais fácil, pelo mais perto, pelo mais confortável, incluí a bicicleta no meu cotidiano para economizar o ônibus e por outros motivos, resolvi problemas caseiros com as próprias mãos para economizar os profissionais, fiz feiras baseadas no essencial e nos supermercados mais em conta, de modo que em menos de duas semanas, tinha transformado meus hábitos mais básicos, assumindo uma posição muito mais criativa no sentido de propor alternativas para gastos, em parte percebidos como desnecessários. Para vocês verem, troquei até a cerveja pela cachaça e, confesso, a economia bateu forte no miaeiro. Foi, então, que hoje tive que encontrar um corte de cabelo barato: não que cortasse cabelo em lugares caros, longe disso, costumava pagar entre R$10 e R$25 - hoje paguei R$15 -, mas sempre, desde tempos imemoriais, pagava esse valor, porque cortava nos mesmos lugares, com os mesmos cabeleireiros, seguindo a lógica dos mesmos cortes. Nunca me dei ao trabalho de experimentar uma coisinha diferente, exceto quando fiz um estrago feio na minha cabeça e tive que raspá-la. Um amigo de longa data chamava meu corte de cabelo de panetone ou brócolis. Eu achava parecido com o corte de xorxinho. Foi então que encontrei um salão bem chamativo, salão não, <i>alguma coisa</i> <i>hair design, </i>expressão que me deixou receoso, já entrei nervoso perguntando o preço, o rapaz respondeu calmamente o valor, recomendou que eu sentasse para decidir o corte através de uns recortes de revista, depois que terminou o serviço, disse que o corte combinava com meus óculos, gostei disso e saí de lá com meu primeiro cabelo fashion da periferia. O melhor é que ao final ainda recebi um cartão fidelidade: "traga toda vez que voltar - e com certeza vou - e na sexta visita, o corte sai de graça". Yes. Também gostei de escutar histórias diferentes dos salões anteriores, enquanto o rapaz estava cortando o meu cabelo - aliás, ele lembrava muito o personagem Karasu de <i>Yu Yu Hakusho -</i> soltava alguns comentários para o seu secretário sobre um ex-namorado que estava para ser demitido do trabalho no supermercado ali perto. Sem dúvida, o melhor foi: "menino, tu acredita que ele colocou no currículo que sabe falar italiano? A bicha assistiu duas ou três novelas, <i>Terra Nostra</i>, <i>Passione</i> e outra aí, aprendeu meia dúzia de palavras, <i>babbo, puzzona </i>e <i>capisce</i> e já colocou no currículo que sabe falar italiano? Só tenho uma coisa para dizer quando encontrar com ele, viu? PER FAVORE".</div>
Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-2228140459512772571.post-4027401752706965102013-03-27T13:40:00.001-03:002013-03-27T13:50:14.625-03:00#retalhodeconversa<div style="text-align: justify;">
Enquanto andava no centro da cidade, perto da Câmara dos Vereadores, dois rapazes encorpados e altos, desses talhados músculo a músculo pela dureza do cotidiano, descarregavam um caminhão com material de construção. A alguns metros de distância, sob o sol dos infernos, percebi que trocavam algumas palavras em clima de animosidade, entre as idas e vindas com sacos de cimento, tijolos e argamassas, delineando um diálogo minimalista, essencialmente composto por perguntas tremulantes e respostas categóricas:</div>
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- Sou gay.<br />
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- Gay?<br />
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- É. Gay. Gay. Gay, sabe?<br />
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- Sei. Gay. (<i>Silêncio</i>). Mas frango não, né?<br />
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- Frango não. Gay.Rodrigo Almeidahttp://www.blogger.com/profile/02839083353429592643noreply@blogger.com0