domingo, 4 de maio de 2003

Cerveja

Aí deu uma vontade louca de tomar cerveja, daquelas que você fica feliz só pela vontade, liguei para minha companheira oficial de cachaça ltda e ela recusou toda braba porque tinha que fazer brigadeiro. Fiquei meio desolado, estava ali pela Rosa e Silva, não sabia bem onde passava meu ônibus, então decidi seguir uma rua qualquer e andar sem lenço e com documento no começo da noite. É sempre bom fazer um passeio de reconhecimento nos bairros que você pouco frequenta. Daí quando cheguei na parada de ônibus, numa praça bem bonita cheia de eucaliptos, fui perguntar sobre o riodoce/cdu a uma senhora que ali se encontrava. Meu irmão, posso até não ganhar no bingo ou no pernambuco da sorte, mas é incrível como as pessoas se abrem comigo sem motivo aparente até porque, pra começo de história, estou muito longe de ser a barraca da simpatia. Então, a senhora começou a dizer todos os ônibus que passavam por lá, um por um, qual demorava mais, qual demorava menos, depois explicou que a parada tinha mudado de lugar, explicou o motivo, reclamou porque não concordava com o motivo, disse que morava não sei onde depois de San Martin, que passava mais de uma hora dentro do coletivo e que nem sempre os jovens ofereciam o lugar para ela sentar. A bichinha falou tanto em tão pouco tempo, tão exasperada, que quase a convidei pra tomar uma cerveja comigo, se fosse mais jovem até rolava, mas logo depois fiquei intrigado, pensando nas pessoas que falam muito com estranhos, tomado pela sensação de que isso acontece, para além das que são naturalmente gralhas e grilos, por ser a primeira vez no dia que elas estão, de fato, conversando com alguém. Bateu a culpa melancólica e terminei dando a maior bola pro papo da senhora, ela era bem solícita pra falar a verdade, tanto que fez questão de me avisar quando meu ônibus apareceu, mesmo que eu já o tivesse visto bem antes, e fez questão de dar parada i-n-s-i-s-t-e-n-t-e-m-e-n-t-e. Subi no coletivo, lotado, normal e quando estou pegando meu passe-fácil, sinto uma mão segurando meu braço com força e tremelique. Olho desconfiado achando ser alguém conhecido e dou de cara com uma mulher que nunca vi mais gorda, daí faço uma expressão de dúvida e ela solta: 'desculpa, achei que você fosse cair'. Sem dúvida tava chapada, não porque ficou a viagem toda traseirando e falando besteiras sem sentido, mas pelo simples fato de que senti o bom cheiro da erva maldita quando passei por perto. Talvez isso tenha contribuído para que eu ficasse a caxangá inteira visualizando uma cerveja, de tal modo que, desci duas paradas antes só pra dar um pulo num lugar onde sempre tem conhecidos dando bobeira. Ontem não tinha uma alma sequer e beber sozinho é fim de carreira demais até mesmo para mim. Cheguei em casa todo cabisbaixo, finalmente tinha admitido a completa derrota, liguei o computador pronto pra reclamar da vida com alguém no msn, quando eis que minha mãe entrou sorrateira no meu quarto e perguntou pela primeira vez desde que me entendo por gente: "Rodrigo, quer uma cerveja? Comprei algumas...". Você nega o quanto pode, faz a adolescência valer até o último minuto, mas tem coisas que só a sua mãe pode fazer por você.

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